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Amigues para sempre

Nunca ouviu falar em gênero neutro? Aquele que faz com que certas palavras terminem em “e” para suprimir os artigos masculino e feminino? E “sexualidade fluida”, sabe o que é? Tem ideia da porcentagem de jovens brasileiros que dizem já ter se relacionado com homens e mulheres? Bem-vindo ao admirável mundo novo da geração Z, onde diversidade e tolerância são as palavras de ordem

Por Fernanda Allegretti Atualizado em 9 Maio 2016, 14h45 - Publicado em 12 fev 2016, 21h08

Se voltassem hoje ao mundo dos vivos, o escritor Álvares de Azevedo, o poeta Manuel Bandeira e o e­x-pr­esidente Floriano Peixoto estranhariam muitas coisas. E uma delas seria o cabeçalho da prova de biologia aplicada no ano passado no colégio em que eles estudaram, o Pedro II, no Rio de Janeiro, o terceiro mais antigo em atividade no Brasil. Ao lado do campo a ser preenchido com o nome de cada estudante, a prova trazia a palavra alunx, em vez de “aluno” ou “aluna”. Todos na classe conheciam o significado daquele xis. Em mensagens trocadas nas redes sociais, jovens e adolescentes usam a letra, assim como o “e”, para suprimir a identificação masculina ou feminina em palavras como “amigx” ou “queridx” – na versão com “e”, mais pronunciável, “amigue” ou “queride”. É o chamado gênero neutro, utilizado basicamente em duas situações: a pedido, quando o outro diz que quer ser tratado assim, ou por iniciativa de quem escreve – e prefere não cravar se o destinatário é homem, mulher, e assim por diante. Assim por diante?

Desconectados, desligados e recém-chegados da Coreia do Norte: ao menos para a geração pós-millenium – também chamada de geração Z ou geração touch -, o número de gêneros já passou de dois faz tempo. No Brasil, o Facebook acrescentou, em março passado, no espaço destinado à identificação do usuário, dezessete novas opções de gênero, além do masculino e feminino. Nos Estados Unidos são mais de cinquenta. A lista inclui cross gender, sem gênero e ainda uma alternativa para personalizar a resposta.

Para esses jovens na faixa de 15 anos, crescidos no universo digital, nunca foi tão normal ser diferente. Os adultos, ligeiramente atordoados, tentam acompanhar o ritmo das mudanças. Em colégios de grandes cidades brasileiras, discutir a diversidade de gênero virou assunto obrigatório. A aula magna do Pedro II deste ano foi sobre o tema. No Bandeirantes, em São Paulo, um grupo de discussão batizado de Bandiversidade reúne alunos para falar sobre homossexualidade, bissexualidade e pansexualidade. Já esquentaram os debates tópicos como as diferenças entre transgênero, transexual e drag queen (transgênero: termo mais abrangente usado para designar pessoas que não se identificam com o sexo de seu nascimento, mas não necessariamente se identificam com o sexo oposto; transexuais: sentem-se pertencentes ao gênero oposto; drag queen: indivíduo do sexo masculino que, em performances quase sempre profissionais, se fantasia de mulher, podendo ser homossexual, bissexual ou heterossexual. Parece complicado? Bem, ninguém disse que era simples).

A “novilíngua” das redes e a onipresença nas escolas do tema da vez podem não durar mais que alguns verões, mas o que elas sinalizam veio para ficar. Não é exagero afirmar que uma importante mudança geracional está em curso. Dados de um levantamento da agência de publicidade J. Walter Thompson mostram que 76% dos jovens brasileiros não dão importância à orientação sexual dos outros e 82% concordam que as pessoas devem explorar mais a própria sexualidade. A J. Walter Thompson ouviu 1 500 pessoas entre 12 e 19 anos no Brasil, nos Estados Unidos e na Inglaterra. Outra pesquisa, coordenada pela psicóloga Luciana Mutti, em Porto Alegre, revelou que 20% dos adolescentes entrevistados já haviam tido relações com pessoas de ambos os sexos. A pesquisa foi feita com 400 jovens de 13 a 18 anos na capital gaúcha.

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Trata-se de uma mudança e tanto. Basta lembrar que, até 1990, a Organização Mundial da Saúde classificava a homossexualidade como distúrbio mental. Em 12 de maio de 1993, um levantamento do Ibope sobre o tema foi capa de VEJA. No Brasil de então, 79% dos entrevistados afirmaram que não aceitariam que seu filho saísse com um amigo gay; 62% declararam que um pai deveria tentar convencer seu filho a mudar de condição se descobrisse que ele é homossexual; 56% responderam que alterariam sua conduta com um colega se soubessem que ele é homossexual; 45% trocariam de médico pelo mesmo motivo; 36% deixariam de empregar um candidato com esse perfil, ainda que fosse o mais qualificado; e 58% se disseram contrários à adoção de uma criança por um casal gay.

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A geração touch

Para Sam Bourcier, professor da Universidade de Lille, na França, o modelo binário (dois sexos, dois gêneros) acabou. Bourcier é um dos mais respeitados porta-vozes da chamada teoria queer. Nasceu mulher, mas não se identifica com nenhum gênero, razão pela qual adotou nome masculino, que apresenta junto com o original, Marie Hélène. O termo queer é uma apropriação da gíria inglesa que significa “estranho”, “esquisito” e que originalmente era usada para se referir jocosamente a homossexuais. Festejadíssima pela geração Z, a teoria sustenta que a sexualidade é fluida e que as preferências nessa área podem mudar ao longo da vida. Um indivíduo do sexo masculino, por exemplo, pode passar boa parte da existência sentindo-se atraído por outros indivíduos do sexo masculino e mais tarde mudar de ideia – o que não necessariamente quer dizer que começará a gostar de mulheres. “Há muitas outras possibilidades de gênero e sexo além daquelas que foram apontadas no nascimento”, diz Bourcier.

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