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Poder demais é sempre demais

Há uma máxima segundo a qual uma autoridade só abusa do seu poder quando tem poder demais

Por Da redação
15 out 2016, 12h30

Um delegado da Polícia Federal é encarregado de investigar o vazamento à imprensa de uma informação oficial. Escolhendo um atalho, ele resolve pedir a quebra do sigilo telefônico do jornalista que publicou a notícia, e uma procuradora da República concorda com a iniciativa. Em Brasília, a juíza do caso aceita o pedido e quebra o sigilo telefônico do jornalista. É uma violação flagrante do direito constitucional de manter fontes jornalísticas em segredo.

Em uma escola do Rio de Janeiro, uma faixa em que se lê “Fora Temer” é colocada no portão de acesso à instituição. O pai de um aluno sente-se ofendido com a mensagem e recorre à Justiça. O juiz afirma que os dizeres da faixa indicam uma “doutrinação política e ideológica” e manda removê-la das vistas dos alunos. É uma violação flagrante da liberdade de expressão.

Há uma máxima segundo a qual uma autoridade só abusa do seu poder quando tem poder demais. No Brasil de hoje, como se constata nos exemplos relatados acima, pode-se até dispensar o requisito do poder excessivo. Mesmo com os poderes regulares, autoridades como delegados, procuradores e juízes, para ficar nos casos em questão, extrapolam os limites de suas funções e tomam decisões abusivas, ilegais, esdrúxulas.

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É um sintoma perigoso para qualquer regime democrático e, entre nós, infelizmente não é algo acidental. Tome-se o festejado pacote anticorrupção proposto pelo Ministério Público Federal e referendado por 2 milhões de assinaturas de cidadãos brasileiros, certamente tão bem-intencionados quanto os próprios procuradores. O pacote lista medidas altamente positivas, mas esbarra em absurdos autoritários. Entre eles, admite a apresentação de provas ilícitas contra o acusado desde que colhidas de “boa-fé” e, pior ainda, reduz o alcance do habeas-corpus, cuja essência é manter o direito de ir e vir a salvo do arbítrio, do abuso de poder.

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O princípio central do habeas-corpus já existia na Inglaterra de Henrique II, em pleno século XII, quando ninguém jamais ouvira falar em um exotismo chamado “direitos humanos”. E, no entanto, os procuradores brasileiros do século XXI acham que esse instrumento de nove séculos deve ser limitado — numa era presidida pela noção de direitos humanos. O que há de errado com eles?

O juiz Sergio Moro, que tem prestado notáveis serviços no combate à corrupção pública, escreveu uma carta ao jornal Folha de S.Paulo para protestar contra um artigo que lhe assestava críticas duríssimas — como se isso fosse inadmissível. Na carta, Moro manifestou surpresa pelo fato de o jornal ter dado espaço a artigo com “opiniões panfletárias-partidárias” impregnadas de “preconceito e rancor” e achou ainda mais surpreendente que o autor do texto, o físico Rogério Cezar de Cerqueira Leite, fizesse parte do conselho editorial do diário.
É desnecessário dizer que o físico — e o padeiro, o músico, o banqueiro — tem direito de fazer as críticas mais ácidas à atuação de uma autoridade pública, ainda que a autoridade em questão seja o juiz Moro, cujo trabalho reacendeu a esperança nacional no fim da histórica impunidade em relação aos crimes dos fortes.

Toda autoridade precisa ser vigiada, contida nos excessos, precisa saber ouvir críticas, servir a quem lhe paga o salário. O único agente público que pode desfrutar de muito poder é o povo. Atribui-se a Thomas Jefferson (1743-1826) afirmação que ele possivelmente nunca fez, mas cujo conteúdo é oportuno lembrar: quando o povo teme o governo, há tirania; quando o governo teme o povo, há liberdade.

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