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Para avançar sobre Uber, Cabify coloca menos carros nas ruas

Empresa busca parceiras, como com o aeroporto de Guarulhos, para melhor atendimento a passageiros

Por Fabiana Futema Atualizado em 29 Maio 2017, 09h35 - Publicado em 28 Maio 2017, 11h10

No Brasil desde junho de 2016, a Cabify tenta avançar sobre o território da Uber e 99, maiores empresas de transporte privado por aplicativo em operação no país. Para se firmar como um dos principais players do setor, a companhia diz que seu diferencial não são os preços nem a rapidez com que os carros chegam até os clientes, mas a qualidade do serviço.

Para manter os motoristas satisfeitos, a Cabify coloca menos carros em circulação nas ruas. Dessa forma, os motoristas conseguem ganhar mais. Esse seria um dos pecados da Uber, segundo Daniel Velazco-Bedoya, diretor-geral da Cabify, pois coloca mais carros que a demanda, reduzindo os ganhos dos motoristas.

Para não criar vínculo com o motorista, a Cabify não exige exclusividade dele. Por outro lado, oferece mimos que acabam fidelizando o parceiro, como bancar a água que é oferecida aos passageiros.

A empresa também busca parcerias com a GRU, concessionária do aeroporto de Guarulhos, para facilitar a vida de motoristas e passageiros. Eis a entrevista com Bedoya:

A primeira impressão é que vocês chegaram mais quietinhos, comendo pelas beiradas, e agora começaram a ganhar volume. Qual a estratégia da empresa para superar a Uber?

Para crescer neste mercado tem que ter um foco grande em investimento de capital e operação. Por entrarmos em partes da cidade, preferimos não fazer barulho na cidade inteira. Primeiro encontramos um nicho de usuários, de potenciais clientes, e começamos a ativá-los.

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Em quantas cidades vocês operam hoje? Há planos de operar em todas as cidades do país?

A Cabify hoje atua em São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Curitiba (PR), Campinas (SP), Santos (SP) e Brasília (DF). Temos um plano de expansão agressivo, mas a princípio não pretendemos estar em todas as todas as cidades. Preferimos cidades com mais de 1 milhão, 2 milhões de habitantes. Santos é um teste para entender como trabalhar melhor em cidades menores.

A escolha das cidades depende da legislação local também?

A legislação federal nos permite atuar em qualquer cidade do país. Levamos em consideração mais aspectos além disso, como questões de mobilidade local e população. A Cabify ainda tem como postura global atuar próximo das cidades e seus governos. Mas lógico que a gente procura operar em cidade que tem uma legislação favorável.

Qual diferencial da Cabify em relação a Uber?

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A Cabify sempre trabalhou com foco no motorista. Os concorrentes trabalham com foco no passageiro. Se foco muito em motorista, vou prejudicar os passageiros. Sai bastante notícia nossa sobre falta de carro. A gente entende essa debilidade, mas faz sentido para nossa estratégia. Os players que trabalham muito focados em passageiros trazem um lado negativo forte para os motoristas. Passageiro quer o quê? Eles querem preço, tempo de chegada, qualidade, segurança, facilidade de conseguir o carro. Se foco muito no passageiro e ele quer primeiro preço e chegada, vou ter que resolver o melhor possível preço e tempo de chegada. Como resolvo isso? Com tarifas mais baixas e colocando muito mais carro nas ruas. Isso significa chegar no tempo adequado, em um ou dois minutos. Para chegar nesse tempo, é preciso gerar ociosidade nos carros. Isso reduz a renda do motorista no final no dia. Se ele ganhava 200 reais, vai passar a tirar 150 fazendo as mesmas horas. Isso reflete na qualidade. A gente entende que esse modelo focado em passageiro sempre vai ter uma externalidade negativa em qualidade e segurança. [Questionada sobre a declaração da Cabify, a Uber informou que serve mais de 50 cidades no Brasil e mais de 500 no mundo, levando a sério sua missão de oferecer transporte eficiente, confiável e acessível a todos].

O que diferencia focar no motorista?

Não colocamos mais carro que a demanda comporta. Isso traz um tempo de chegada mais alto. Em alguns momentos, atender 100% de todos os passageiros é outra problemática.

Quanto ganha um motorista, em média?

De 20 a 25 reais por hora. Se trabalhar dez horas, 250 reais. Isso bruto – tem de descontar combustível, seguro e outros gastos com manutenção.

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Quanto a Cabify cobra de taxa deles? Não dá para baixar esse percentual? A 99, por exemplo, cobra 16,99%

[Cobramos uma taxa de] 25%. Nesses 20, 25 reais [e ganho por hora] já estão descontados os 25%. Nosso modelo de negócio é muito pouco discutido. Eles [99], com certeza, estão tomando prejuízo [A 99 informa que a taxa é um ponto de equilíbrio que torna viável o negócio da empresa e do motorista]. Hoje, o sistema de pagamento on-line custa de 3% a 4% da tarifa total. Tenho um nível de fraude em e-commerce de quase a 20% das transações. Eu recebo e repasso, pago todos os motoristas, mesmo se ele tomar fraude, incorpo esse custo também. Em São Paulo, o custo por km da prefeitura é 3% do ticket médio. Se converter PIS, Cofins, ISS, vou chegar a um custo de 14%. Aí começam detalhe de custo operacional, tipo água. Tudo isso só para fazer uma viagem simples acontecer. Tenho 12% para time, infraestrutura, marketing. Nosso modelo de negócio precisa de uma escala muito grande para conseguir que desse percentual eu tire todos os custos e tenha uma margem que vai fazer a empresa ser lucrativa no longo prazo.

A empresa já é lucrativa?

Não. Hoje, nosso investimento é altíssimo. O custo para trazer um usuário para a plataforma, é de 10 a 20 dólares. Para fechar a conta é muito complexo. Os 25% caem praticamente justo. Dá para trabalhar com menos? Dá, mas hoje investidores não colocam mais investimento em empresas que mostram que não são rentáveis no longo prazo. O cálculo de preço considera todo o gasto do motorista, custo operacional, compra do carro, quanto ele pode ter e porcentagem de ganho e quanto precisa ganhar para que o investimento e tempo dele façam sentido. Considera o que vou tirar e quanto ele vai ganhar, considerando uma renda adequada.

Quem são esses motoristas?

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A maior parte é de desempregados que está tentando outra renda. Grande parte veio da Uber. Eles têm liberdade para escolher qualquer plataforma. A Uber veio antes e fez um trabalho muito bom para nós. Não tivemos competidor em outros mercados que entramos.

Não é prejuízo servir essa água para o motorista fazer corrida para o concorrente?

É complexa a operação com o motorista que utiliza várias plataformas. Uma grande dificuldade é como consigo que todos eles entreguem um diferencial de qualidade por serem Cabify mesmo estando em três plataformas. Traz vários prejuízos e mais que isso, muitos deixam de aceitar viagens de outras plataformas. E quando não aceitam uma viagem Cabify, o custo que passei de 10 a 20 dólares existiu, mas o usuário não usou. Então a gente perdeu de 10 a 20 dólares. Em outros mercados trabalhamos com exclusividade, mas no Brasil não é possível trabalhar assim.

Em algum momento vai ser possível trabalhar com exclusividade?

Não, até pela questão do risco trabalhista de criar um modelo de trabalho como esse.

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Então é uma forma de proteção?

Também. A dinâmica da legislação é mais complexa no Brasil que em outros países. Então a gente evita vários riscos para não prejudicar nossa operação, e esse é um caso claro.

Vocês não têm tarifa dinâmica. O congestionamento afeta o custo?

Sim, e aí a gente fica mais barato [que os concorrentes com tarifa dinâmica, como Uber]. Mas no final do dia, se considerar os horários em que não há congestionamento, a gente consegue maximizar a renda do parceiro, ainda mais por não termos uma oferta de carro tão alta. Então eu consigo pagar mais para ele. É isso que faz ele escolher Cabify em primeiro lugar.

A empresa vistoria os carros dos motoristas prestados de serviços?

A gente separa a qualidade em três pontos: 1) a entrada dele na plataforma, desde análise documental, reunião presencial informativa onde passamos boas práticas de atendimento, o que deve fazer, como vale a pena atender uma pessoa, como se vestir; 2) depois tem vistoria dos carros, que vê se eles são limpos, adequados, não amassados; 3) eles fazem um exame toxicológico. Só depois entra na plataforma. A primeira etapa já faz um filtro enorme dos tipos de motorista que a gente espera. E uma vez dentro da plataforma, eles continuam sendo avaliados.

Além do custo trabalhista, que outros diferenciais que existem no Brasil que obrigam a empresa a adotar uma operação diferente aqui?

O regime fiscal aqui é complexíssimo, isso gera algumas mudanças na forma de operar. No Brasil, a gente opera como agência de transporte. Em outros países, atuamos como transportador. Como agência de viagem, a gente intermedia duas pontas: o passageiro e motorista, que é o transportador. A grande mudança fiscal é que eu só vou fazer a contribuição em cima dos 25%.  Se eu fosse transportador, entraria na lei de transportadores, aí teria que contratar todos os motoristas, a frota teria que ser minha. E toda receita que entrasse teria de ser declarada como se fosse dinheiro meu. Pagar imposto sobre tudo e não sobre 25%. Isso mataria o modelo de negócio.

Quanto representa o Brasil para a Cabify?

O Brasil está entre os top 5 para a Cabify: México, Chile, Peru, Espanha. Brasil está nesse grupo.

Como vocês atuam no aeroporto de Guarulhos?

Estamos negociando com o GRU, que tem a concessão, para criarmos um modelo de habilitação lá.  O estamos tentando fazer com GRU é criar postos de parada claros dentro do aeroporto, pontos de espera para o motorista pra não ficar em qualquer lugar da cidade.

É problemático trabalhar no Rio?

No Santos Dumont, dá para operar, lógico que tem problema com taxista lá. A gente se preocupa em relação a isso. Não atendemos no Galeão, bloqueamos o acesso. Mesmo nesse ambiente um pouco mais complicado, o Rio já tem cenário bem mais positivo para iniciar a regulamentação. O problema do Rio hoje são as eleições do ano passado. Em ano de eleição tem que tomar decisão e um lado. O prefeito, na época, trouxe várias saídas em relação aos taxistas. Para mim, era muito mais posição eleitoral do que olhar para a realidade da cidade. Com o nível de desemprego que se tem, com os cofres públicos zerados, o Rio não tem nada de dinheiro… E a gente gera uma renda gigante para milhares de pessoas da cidade e resolve outro problema de mobilidade. É muito claro o quão positivo é para o município ter uma solução como a nossa.

Qual o papel das administrações na regulamentação dessa atividade?

O papel dele é entender que diferencial os táxis têm em relação ao nosso modelo. São Paulo fez muito bem em criar corredores de ônibus que podem ser utilizados por taxistas. Isso faz os táxis serem mais rápidos, já é um diferencial. Eu não posso fazer uma mudança estrutural dessa, quem faz são as administrações. Não se pode ter um único modelo de transporte para diversos tipos de necessidade de consumo.

Vocês também operam com táxis?

Hoje, em São Paulo, a gente opera com táxis pretos. A gente não levanta a bandeira de motorista autônomo, privado, taxista ou não. Sou uma ferramenta de mobilidade, tenho uma categoria que traz isso e outra traz qualidade e é rápida. Existe uma discussão entre taxistas e o nosso modelo, só que o ponto final da história está na mão do governo de entender como os dois modais conseguem conviver. Simplesmente habilitar e trazer uma solução igual vai continuar criando esse atrito e não reduz discussões entre os dois lados.

Quantas empresas de aplicativo de transporte vão existir?

Essa discussão existe globalmente. No meu ponto de vista, devem existir poucos players daqui dois ou três anos. Uns três ou quatro em nível global. Em nível nacional, uns dois ou três, não muito mais que isso. Um único, pelo que acontece agora no mercado, ficou claro que uma plataforma única não consegue atender bem todos os segmentos de consumo e transporte. Como não consegue fazer isso, existem outras. A Cabify é uma delas. Esse é o ano que vai explicar todo o mercado brasileiro, quem fica e quem sai.

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