OAB repudia quebra de sigilo de jornalista da revista ‘Época’
Murilo Ramos foi alvo de um pedido de quebra de sigilo telefônico por causa de uma matéria divulgada em fevereiro do ano passado
A Ordem dos Advogados do Brasil divulgou nota, no último domingo, repudiando a quebra de sigilo do jornalista e colunista da revista ‘Época’ Murilo Ramos. De acordo com o presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, o processo representa “um grave ataque à liberdade de imprensa e à Constituição”.
Em agosto, a juíza Pollyanna Kelly Alves, da 12ª Vara Federal de Brasília, pediu a quebra de sigilo telefônico do jornalista, para tentar descobrir a identidade de uma de suas fontes. A medida só veio a público no último sábado. A decisão da juíza foi tomada depois que o delegado da Polícia Federal João Quirino Florio entrou com representação na Justiça e teve a anuência da procuradora da República no Distrito Federal Sara Moreira de Souza Leite.
Em abril do ano passado, Quirino ficou encarregado de investigar o vazamento de um relatório do Conselho de Controle das Atividades Financeiras, o Coaf, à revista ‘Época’. No documento, os investigadores do Coaf listavam os brasileiros suspeitos de manter contas secretas na filial suíça do HSBC, no escândalo conhecido como SwissLeaks. A investigação do Coaf e o teor do relatório foram revelados pela revista em fevereiro de 2015, em reportagem que contou com a apuração do jornalista Murilo Ramos.
Depois de afirmar que a Receita, a Coaf e o Banco Central não haviam conseguido descobrir a origem do vazamento, o delegado João Quirino pediu à juíza que quebrasse o sigilo de Ramos.
Diante do ocorrido, a Associação Nacional de Editores de Revista (Aner) impetrou habeas corpus, na última sexta-feira, pedindo a suspensão imediata da decisão da juíza. O HC foi distribuído ao desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1). Em nota, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ) repudiaram a decisão da juíza e reforçaram “que não há jornalismo e nem liberdade de imprensa sem sigilo da fonte, pressuposto para o pleno exercício do direito à informação”.
Constituição
O sigilo da fonte é um direito constitucional, conforme prevê o artigo 5º da Constituição Federal. “É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”, diz o texto. De acordo com Marcelo Figueiredo, professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, “a comunicação telefônica está abrangida pelo sigilo da fonte” e, portanto, é “inconstitucional e abusivo” pedir a quebra do sigilo.
Ao site de VEJA, Murilo Ramos contou que recebeu com “surpresa” a decisão da magistrada Pollyanna e afirmou que a medida é uma “afronta” ao texto constitucional. “Essa decisão traz um prejuízo muito grande para a atividade jornalística porque jornalistas têm acesso a informações estratégicas que muitas vezes não viriam à tona se não fosse sob a condição de sigilo. Esse episódio pode criar uma insegurança para quem conversa com jornalistas e quem perde com isso é a população, que deixar de ter acesso à informação”, disse.
Procurada, a juíza Pollyanna Kelly Alves, da 12ª Vara Federal de Brasília, não foi encontrada para comentar o caso. A assessoria de imprensa da Procuradoria da República do Distrito Federal disse que não vai comentar o caso.