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Mulheres presas com homens

Quando entram na cadeia, toda a discussão sobre direitos dos e das trans que tanto tem movimentado o mundo já não as alcança mais

Por Daniela Meggiolaro
Atualizado em 13 out 2017, 22h49 - Publicado em 13 out 2017, 13h22

Nos últimos anos o mundo viu crescer a discussão sobre os direitos da comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros). A discussão tirou o tema do armário e isso foi decisivo para que garantias fossem reconhecidas no papel e fora dele. Pessoas do mesmo sexo puderam passar a se beijar e andar de mãos dadas na rua. Com o tempo veio a aprovação legal do casamento homoafetivo, o reconhecimento ao direito de um casal de homens ou de mulheres adotar uma criança e a possibilidade de uma pessoa escolher a que gênero quer pertencer.

São conquistas importantíssimas que marcam uma época. Hoje o tema da transexualidade é tratado abertamente na novela das nove e há vários exemplos de pessoas bem sucedidas que levaram o debate para o grande público, como a cartunista Laerte, o ator Thammy Miranda, a travesti Rogéria, a modelo Lea T. e tantas outras e outros. Elas, felizmente, tiveram suas escolhas respeitadas, muitas vezes admiradas.

A realidade da grande maioria da população trans no Brasil, no entanto, não passa perto disso. Rejeitadas pela sociedade, a começar pela própria família, muitas travestis e transgêneros encontram na prostituição uma das poucas opções de trabalho, quando tinham o sonho de serem advogadas, médicas, jornalistas, publicitárias, como qualquer ser humano.

O problema fica ainda mais evidente quando se olha para as estatísticas. O país ostenta o lamentável recorde mundial de assassinatos de travestis e transexuais, de acordo com relatório elaborado pela Rede Trans Brasil. Em 2016 foram 144 mortes, mais que o dobro do México, o segundo colocado. Segundo pesquisa realizada em 2013 pelo IBGE, a expectativa de vida desse grupo social não passa dos 35 anos, menos da metade da média nacional dos quase 75 anos da população em geral.

As que tiveram “sorte” e não foram assassinadas não raramente são jogadas para o mundo do crime. Pequenos roubos, tráfico de quantidade irrisória de drogas, brigas, crimes punidos com prisão em um sistema penitenciário que aprofunda ainda mais o preconceito e a exclusão. Quando cruzam a porta da cadeia essas mulheres perdem completamente o direito de serem mulheres. Toda a discussão sobre direitos dos e das trans que tanto tem movimentado o mundo e o país já não as alcança mais.

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Nos indignamos com a história da menina que ficou presa por quase um mês em uma cadeia em Abaetetuba, no Pará, em 2007, mas nem sequer pensamos sobre as centenas de mulheres que passam anos encarceradas ao lado de homens violentos sendo violentadas diariamente. Por quê? Os diretores de muitas instituições prisionais, em atitudes machistas e covardes, obrigam essas mulheres a raspar o cabelo e as impede de continuar o tratamento hormonal. Perdem o direito de serem chamadas pelo nome que escolheram porque muitos agentes penitenciários fazem questão de usar seus nomes de registro.

Pessoas que cometeram crimes devem pagar por isso. Se condenadas, devem cumprir suas penas. Mas penas que incluem humilhação, estupro e falta de dignidade não agridem apenas as que sofrem diretamente suas consequências. Revela que somos uma sociedade que compactua com práticas medievais, bárbaras, desumanas. É isso o que queremos ser?

Daniella Meggiolaro é advogada, sócia do escritório Malheiros Filho, Meggiolaro e Prado e diretora do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD)

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