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Lindemberg Alves é condenado a 98 anos de prisão

Sentença foi anunciada na noite desta quinta-feira, três anos e quatro meses após a morte da jovem Eloá Pimentel, aos 15 anos. Julgamento, que durou quatro dias, ocorreu no Fórum de Santo André, no ABC Paulista

Por Carolina Freitas, Cida Alves e Bruno Huberman, de Santo André
16 fev 2012, 18h50

“Nada vai suprir a minha dor, mas a justiça foi feita”

Ana Cristina Pimentel, mãe de Eloá

Acusado de matar a tiros a jovem Eloá Pimentel, de 15 anos, em outubro de 2008, o ex-motoboy Lindemberg Alves, de 25 anos, foi condenado a uma pena de 98 anos e dez meses de prisão. Após quatro dias de julgamento no Fórum de Santo André, no ABC Paulista, a sentença foi lida pela juíza Milena Dias por volta das 19h30 desta quinta-feira. A punição máxima prevista pela legislação brasileira é de trinta anos. Devido à fundamentação da sentença, a Promotoria não crê em redução da pena.

Lindemberg foi condenado pelos doze crimes dos quais foi acusado: homicídio qualificado de Eloá, tentativa de homicídio de Nayara Rodrigues da Silva e do sargento da Polícia Militar Atos Valeriano, sequestro e cárcere privado de Eloá, Nayara e dos outros dois jovens que ficaram reféns, Victor Lopes de Campos e Iago Vilela de Oliveira, além de disparo de arma de fogo. “O réu agiu com frieza, premeditadamente, por orgulho e egoísmo”, disse a magistrada. “Durante a barbárie, deu-se ao trabalho de dar entrevistas a apresentadores de TV, reforçando seu comportamento audacioso e frieza assustadores”.

O mais longo cárcere privado da história policial de São Paulo – que durou mais de cem horas – chocou o país e terminou de forma trágica, com a morte de Eloá e com Nayara, à época também com 15 anos, baleada. Ela chegou a ser liberada do cativeiro, mas voltou. Amigos de Eloá, Victor e Iago também foram mantidos reféns no apartamento em que a jovem morava com a família e saíram ilesos.

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Reações – Severa, Milena Dias destacou, em sua sentença, que “a sociedade espera que o juiz se liberte do fetichismo da pena mínima”. De pé à frente dela, Lindemberg começou a ouvir a sentença com a cabeça erguida, mas, quando ela anunciou a pena, mudou de postura e passou a olhar para o chão até o fim da leitura. Deixou o plenário cabisbaixo e algemado, conduzido por dois policiais. Emocionada, a mãe de Eloá, Ana Cristina Pimentel, ouviu a sentença de pé, de mãos dadas com o filho mais velho, Ronickson Pimentel. Ao fim da leitura da sentença, cerca de 150 pessoas que estavam na plateia aplaudiram.

“Nada vai suprir a minha dor, mas a justiça foi feita”, disse Ana Cristina, mãe de Eloá, na saída do Fórum. “A pena foi justa e agora ele vai ficar preso para se redimir do que fez e não fazer com outras pessoas”. A mãe de Nayara, Andréa Rodrigues, também comentou a sentença. “Não sou que tenho que perdoar Lindemberg – é Deus”.

Para a promotora Daniela Hashimoto, a pena imposta a Lindemberg foi a resposta da sociedade à banalização da violência contra a mulher. Para ela, Lindemberg é arrogante e manipulador e tentou manipular os jurados. “Ele demonstrou exatamente quem ele é”, declarou. “A ação foi premeditada para tirar a vida de Eloá e de Nayara que, pra ele, era a culpada pelo rompimento do casal”.

Após a condenação, a advogada de defesa, Ana Lúcia Assad, anunciou que vai pedir a anulação do julgamento. “Não há probabilidade técnica de anular o júri”, disse o assistente de acusação José Beraldo.

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Imaginário – O caso Eloá faz parte de um rol de crimes que mexeram com o imaginário popular, como a morte da menina Isabella Nardoni e o assassinato do casal Richtofen. A diferença é que, ao contrário desses casos, assassino e vítimas não pertenciam à mesma família. O caso Eloá não rompeu um daqueles tabus primordiais que proíbem o infanticídio ou o parricídio. Na essência, não é diferente de centenas de crimes passionais que ocorrem todos os dias.

Dois elementos deram destaque à morte de Eloá: o envolvimento de certo tipo de imprensa que, de seu papel observador, passou a uma espécie de protagonismo, e a ação desastrada da polícia. Mas, ao contrário do que sustentou a defesa de Lindemberg, ninguém é culpado – a não ser o próprio assassino, quando puxa o gatilho.

A responsabilidade pela morte da jovem, portanto, não é da sociedade, nem da imprensa – embora, ressalte-se, quanto menos protagonista, mais precisa em seu papel de informar será a imprensa. Além disso, apesar dos avanços, o episódio demonstra que a polícia ainda precisa avançar em seus mecanismos de negociação. Do contrário, não teria consentido em mandar de volta ao seu algoz uma jovem de 15 anos, Nayara.

Acusação e defesa – O julgamento durou quatro dias e foi encerrado na tarde desta quinta-feira. A sessão teve início às 10 horas com os momentos mais decisivos do júri: o embate entre entre defesa e acusação, tendo, de um lado, a promotora Daniela Hashimoto e, de outro, a advogada do réu, Ana Lúcia Assad. Após os debates, os sete jurados se reuniram na sala secreta para chegar a um veredito e a juíza Milena Dias redigiu a sentença, proferida por ela pouco depois das 19h30.

Sob o olhar atento de Lindemberg, Daniela Hashimoto foi a primeira a falar. Ressaltou: o réu sabia exatamente o que iria fazer quando chegou ao apartamento da ex-namorada no dia 13 de outubro de 2008. “Coloquem-se no papel das vítimas”, disse aos jurados. Segundo ela, uma mensagem no celular de Eloá foi o motivo do primeiro disparo, quando, no primeiro dia de cativeiro, Lindemberg atirou em direção à multidão que se aglomerava do lado de fora.

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Embora Lindemberg tenha admitido que atirou em Eloá, ele disse em seu interrogatórioque não se lembrava de ter disparado contra Nayara. Daniela foi categórica: “A perícia comprovou que a Nayara foi atingida por um projétil de calibre 32”, disse. “Só Lindemberg tinha essa arma no dia dos fatos”. A promotora também destacou características de manipulação, dissimulação e exibicionismo do réu e seu comportamento obsessivo. “Eloá para ele não era mais do que um objeto. Ele tinha ódio dela”, disse a promotora.

A advogada Ana Lúcia Assad tentou imprimir um tom emocional em sua fala. Ela tentou buscar identificação entre seu cliente e os sete jurados. “Os senhores são pessoas de bem, assim como Lindemberg”, disse.”Enxerguem Lindemberg com o coração porque ele não é bandido. Peço que olhem para ele como para um irmão”.

A advogada gastou mais tempo para se defender de uma suposta discriminação que afirma sofrer do que exibindo a versão do réu sobre o crime. “Tentaram passar a imagem de que essa defensora fosse burra”, afirmou. “Eu quase fui linchada quando fui almoçar, minha mãe me ligou chorando. Se eu estivesse fazendo alguma coisa errada, por que a OAB estaria aqui? Por que eu sou uma louca?”, indagou.

Foi uma tentativa de colocar a si própria e a Lindemberg, mais uma vez, como vítimas da imprensa, criando uma analogia entre a pressão que o acusado diz ter sentido durante o sequestro e a pressão que ela diz estar sofrendo. A advogada argumentou que Lindemberg estava sob intenso stress na época do crime – assim como ela, durante o julgamento. “Ele precisava de um tempo – e não deram um tempo para ele tomar uma decisão correta”.

Embora tenha ressaltado que não ia pedir a absolvição de Lindemberg, empenhou-se na tentativa de diminuir a pena que será imposta ao réu: pediu aos jurados que o condenassem por homicídio culposo (sem intenção de matar) pela morte de Eloá. “Ele sofre pela morte dela”. E disse que Nayara voltou ao cativeiro por vontade própria. E pleiteou a condenação por lesão corporal culposa. “Ele errou, tomou as decisões erradas e deve pagar por isso, mas na medida do que ele efetivamente fez”.

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Advogada de defesa, Ana Lúcia Assad, chega para o terceiro dia de julgamento
Advogada de defesa, Ana Lúcia Assad, chega para o terceiro dia de julgamento (VEJA)

Fim do silêncio – O terceiro dia foi o mais esperado de todos. Foi quando Lindemberg rompeu o silêncio e falou pela primeira vez sobre o crime. O réu admitiu ter atirado em Eloá. “Depois da explosão, Eloá fez um movimento como se fosse levantar do sofá”, contou. “Achei que ela ia tentar tirar a arma da minha mão e, sem pensar, atirei. Foi tudo muito rápido. Eu não pensei”. Na plateia, a mãe de Eloá, Ana Cristina Pimentel, chorou. Lindemberg não derramou uma lágrima: “Não estou aqui para dar show“, disse.

Lindemberg também admitiu ter atirado para fora do apartamento, mas negou ter tentado acertar o policial militar Atos Antonio Valeriano, que comandou as negociações nos primeiros dois dias do sequestro. “Isso é totalmente ficção”, afirmou. Ele também negou ter se vangloriado pelo disparo.

O réu pediu perdão à família. “Eu queria pedir em público perdão à dona Tina (mãe de Eloá) por tudo o que aconteceu”. Em outro momento, quando a juíza explicava que ele deveria ser claro em seu depoimento, o réu voltou a se dirigir à família da vítima: “Eu só estou aqui para dizer a verdade. Tenho uma dívida muito grande com a família da Eloá.

Teatro – Nos dois primeiros dias, a advogada de Lindemberg foi a protagonista – se destacou mais que o próprio réu. Na terça, teve de deixar o Fórum pelos fundos sob intensas vaias do público na hora do almoço. Nesse dia, chegou a dizer que a juíza Milena Dias, que presidiu o júri, tinha que voltar a estudar. Em resposta, foi ameaçada de processo por desacato pela promotora Daniela Hashimoto. Ela também surpreendeu ao voltar atrás na intenção de arrolar a mãe de Eloá como testemunha depois de ameaçar abandonar o julgamento no primeiro dia.

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Visivelmente irritada, Ana Lúcia desabafou, criticando a imprensa – para ela, corresponsável pelo crime: “É por causa de alguns membros da imprensa também que esse caso existe.” Depois, tomou uma atitude no mínimo inusitada: levou ao plenário sua insatisfação com a imprensa, voltou a dizer que não tem segurança para ir às ruas. E, com ar teatral, exibiu um colete à prova de balas. “Por causa da imprensa, essa advogada está sendo muito hostilizada pelos populares que acompanham o julgamento e teme por sua integridade física. Tanto é verdade que foi enviada a essa defensora um colete à prova de balas”, disse.

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