Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Governo Lula distribui auto-propaganda a escolas, vereadores e sindicatos

Por Fernando Mello, Mirella D'Elia
2 jun 2010, 20h56

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já avisou muitas vezes que não irá poupar esforços para eleger Dilma Rousseff sua sucessora. Há quatro anos, Lula foi multado em 900.000 reais por distribuir uma cartilha que foi considerada propaganda antecipada. Em uma nova eleição, o governo repete o método: começou a distribuir no mês passado um caderno com 43 páginas que exalta programas governamentais e faz elogios à gestão Lula. A publicação é chamada “BRASIL 2009 – Estamos vivendo um novo Brasil. Feito por você. Respeitado pelo mundo”. Em todas as páginas o bordão “estamos vivendo um novo Brasil” é repetido.

Logo na apresentação, o texto diz que “o Brasil está no caminho certo”. A conclusão é ainda mais laudatória e aponta para o futuro, em um ano eleitoral em que Dilma é candidata. Diz o texto: “As principais conquistas do povo brasileiro em 2009 e suas projeções para os próximos anos são apresentadas nesta publicação, que é uma prestação de contas do governo federal, mas também uma demonstração de que o Brasil sabe enfrentar os desafios e encarar o futuro”.

A Secretaria de Comunicação da Presidência, responsável pela publicação, diz que imprime o texto todos os anos e que, em 2010, foram produzidos 1,2 milhão de exemplares, ao custo total de 2,195 milhões de reais. A entrega do material ocorreu em 207 mil escolas municipais, estaduais e federais, universidades, federações, sindicatos, bibliotecas, governos estatuais,prefeituras, embaixadas, deputados, vereadores e ONGs. “A distribuição deste ano está praticamente concluída, e nenhum exemplar será entregue no período eleitoral, assim eventual saldo não distribuído até a próxima semana, somente será entregue depois de outubro”, informou a Secom por e-mail.

O caderno do governo federal foi citado nesta terça pelo pré-candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, que criticava o mau uso de verbas públicas. VEJA.com esteve em três escolas e encontrou o exemplar em uma delas, na zona sul de São Paulo. Com impressão em quatro cores e fartamente ilustrado com fotos, o material foi distribuído em envelopes do gabinete da Presidência da República.

A cartilha traz dados inflados sobre a gestão Lula. Em um dos mapas, afirma que, desde 2003, “foram criadas 13 novas universidades e 2 foram consolidadas”. Ocorre que o próprio ministério da Educação já reconheceu que nove dessas universidades são resultado de transformação ou desmembramentos de instituições já existentes, alegando que “quase todas as universidades brasileiras foram criadas dessa maneira”.Além disso, o mapa do Brasil lista todas as universidades e escolas técnicas, sejam elas feitas durante o governo Lula ou não (veja imagem).

Em outros casos, há omissões. Um exemplo aparece no programa habitacional Minha Casa, Minha Vida. Dados encaminhados, em março, pela Caixa Econômica Federal ao Tribunal de Contas da União mostram que quase 262.000 moradias foram financiadas até dezembro de 2009 e os investimentos no programa já envolveram aproximadamente 13 bilhões de reais. Os dados utilizados na cartilha foram consolidados até 13 de abril e mostram que foram 408.674 unidades contratadas. Ocorre que, até dezembro, somente 1.221 unidades habitacionais haviam sido concluídas e entregues, número que representa 0,6% da meta de milhão de casas prometidas pelo programa. Na cartilha, o governo federal omite quantas casas foram efetivamente concluídas.

Continua após a publicidade

Na parte dedicada ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), os dados dão conta de um investimento de 403 bilhões de reais até dezembro de 2009. O valor previsto até o fim de 2010 é de 638 bilhões. A cartilha omite uma informação divulgada nesta terça pelo próprio governo: até abril de 2010, os empreendimentos concluídos no PAC equivalem a R$ 302,5 bilhões, ou 46,1% do total previsto para o período. Também são listados números do PAC 2, programa lançado por Dilma Rousseff para o período pós-2010.

No caso da Reforma Agrária, o governo não informa que deixou de cumprir suas próprias metas de assentamentos. O único dado que está na cartilha é de que, desde 2003, foram 574.609 famílias assentadas. Desse total que o governo diz ter assentado, 387,5 mil (67%) estão na Amazônia Legal (Estados do Norte, Mato Grosso e Maranhão). Segundo especialistas, esse tipo de assentamento ocorre porque as terras são mais baratas, mas têm problemas graves de infraestrutura. Além disso,o governo não informa que, em sete anos de gestão, a promessa anual de famílias contempladas na reforma agrária foi cumprida uma única vez, em 2005.Em 2009,foram 55.498 famílias assentadas, mas a meta era de 75.000.

No caso das escolas técnicas, o material diz que, no Distrito Federal, uma escola foi “implantada” em 2009 e quatro “programadas” para 2010. A única escola inaugurada no ano passado foi a de Planaltina, que existe desde 1958 , aberta durante o governo Juscelino Kubitschek. O governo federal diz que a unidade foi iincorporada à Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica em 2009 e que, ao se tornar federal, passou por uma completa mudança em sua infraestrutura física, quadro de pessoal, recursos orçamentários de manutenção e gestão e proposta pedagógica.

Multa – Há quatro anos, a distribuição de outra cartilha do governo federal fez com que o TSE decidisse punir severamente o presidente Lula por propaganda eleitoral antecipada: multa de 900 mil reais. No entanto, até hoje não houve pagamento. E a discussão se arrasta na justiça. A multa foi decidida pelo plenário do TSE em agosto de 2006.

Ao julgar uma representação proposta pelo PSDB, os ministros entenderam que a publicação, chamada “Brasil, um país de todos”, fazia propaganda fora do prazo estipulado pela legislação eleitoral – a partir de julho do ano em que o pleito ocorre.

Continua após a publicidade

Mais de um milhão de exemplares foram distribuídos em janeiro de 2006 pela Casa Civil e pelo ministério do Planejamento. Ao mandar punir Lula, o relator da ação, ministro José Delgado, destacou que a cartilha fazia “louvores às realizações do governo federal, sem objetivo de orientação educacional, informação ou comunicação social”. O governo recorreu e a discussão já foi interrompida quatro vezes por pedidos de vista. O TSE decidirá se a multa será reduzida.

Caráter informativo – Legalmente, a propaganda institucional só é proibida nos três meses anteriores à eleição. Mas é preciso atender a alguns critérios para não ferir a Constituição Federal. A publicação precisa ter caráter informativo e não prestar-se à promoção de autoridades.

Diz o texto constitucional: “A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”.

Um ex-ministro do TSE ouvido por VEJA.com disse estranhar a distribuição do material. “Não vejo razão para isso a não ser tentar atrair posições simpáticas”. O Ministério Público ou qualquer cidadão podem questionar na justiça uma publicação do governo caso desconfiem de mau uso do dinheiro público. O Ministério Público também pode pedir à Justiça Eleitoral a abertura de uma investigação para apurar se houve irregularidades.

Leia no blog de Reinaldo Azevedo:

Continua após a publicidade

Pouco importa quem vença a eleição de 2010 – o tucano José Serra ou a petista Dilma Rousseff – uma coisa é certa: a legalidade já perdeu. E a bandalheira é, por enquanto, amplamente vitoriosa. E, como já afirmei aqui outras vezes, os petistas estão descobrindo que o crime, também o eleitoral, compensa. Lula já não disfarça, não tenta fingir, não tergiversa. É mesmo um homem sincero: usa a máquina e pronto! E se considera acima da lei.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.