Engenheiro elétrico ou engenheiro eletricista?
“Desde o início de meu curso de engenharia elétrica, soube que ‘engenheiro elétrico’ está errado, a única forma correta seria ‘engenheiro eletricista’. A explicação, talvez literal demais, seria por causa do adjetivo ‘elétrico’, que obrigatoriamente estaria indicando que somos seres humanos magicamente carregados eletricamente após recebermos nossos diplomas. Não vejo motivo para essa proibição, ou […]
“Desde o início de meu curso de engenharia elétrica, soube que ‘engenheiro elétrico’ está errado, a única forma correta seria ‘engenheiro eletricista’. A explicação, talvez literal demais, seria por causa do adjetivo ‘elétrico’, que obrigatoriamente estaria indicando que somos seres humanos magicamente carregados eletricamente após recebermos nossos diplomas. Não vejo motivo para essa proibição, ou melhor, vejo que, se fosse assim, também seriam proibidos o ‘engenheiro mecânico’ e o ‘engenheiro eletrônico’. Mas concordo com o ‘engenheiro sanitarista’ em detrimento do ‘engenheiro sanitário’, mas apenas por senso estético. Qual é o seu veredicto?” (Kleber Weise)
Kleber tem razão. Só uma mente atacada pelo vírus do literalismo, que infelizmente tem se mostrado altamente contagioso (veja o caso de “risco de morte”), pode se incomodar com uma locução como “engenheiro elétrico” sob o argumento de que um indivíduo desse tipo daria choque.
O que ocorre nesse caso é simples: o profissional herda diretamente o adjetivo que distingue sua atividade, algo que todo mundo entende, sem a necessidade de lhe acrescentar novas sílabas pernósticas em nome da hipercorreção.
Como prova disso, são excelentes os exemplos de engenheiro mecânico e engenheiro eletrônico citados por Kleber (a ressalva do “engenheiro sanitarista” também é pertinente, pela razão exposta).
Na mesma linha, acrescente-se que, a não ser em casos de literalismo terminal, não passa pela cabeça de ninguém que o gerente financeiro seja feito de cifrões, o físico nuclear seja radioativo, o programador visual precise se vestir de forma chamativa (embora muitas vezes o faça), o jornalista esportivo seja um atleta e o guarda florestal corra risco de desmatamento.
Poderíamos ficar nisso o dia inteiro, mas não é necessário. Os exemplos acima bastam para ilustrar a tendência sintética que leva a língua a não gastar letras desnecessárias – no caso, atribuindo o mesmo adjetivo que define uma especialidade, como física nuclear, programação visual ou engenharia elétrica, aos profissionais que a exercem.
Ah, e no caso de alguém sentir falta de um argumento de autoridade: sim, o Houaiss abona “engenheiro elétrico”.
Se é verdade que os próprios engenheiros elétricos andam remando contra essa corrente profunda da língua, algo que eu desconhecia, deve-se reconhecer que têm esse direito. Mas é como tentar iluminar a grande São Paulo com quatro pilhas de tamanho médio.
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