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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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Trapalhadas no Enem custam uma demissão; nova presidente do Inep é conhecida deste blog. E é também um espanto!

E as trapalhadas no Enem renderam uma demissão e uma nomeação. A educação poderia ter sido premiada com a substituição. Mas sai perdendo de novo. Vamos ver. O MEC de Fernando Haddad aprontou mais uma, como todos viram. Além de milhares de alunos não conseguirem se inscrever no sistema unificado de distribuição de vagas (SISU), […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 13h07 - Publicado em 19 jan 2011, 06h05

E as trapalhadas no Enem renderam uma demissão e uma nomeação. A educação poderia ter sido premiada com a substituição. Mas sai perdendo de novo. Vamos ver.

O MEC de Fernando Haddad aprontou mais uma, como todos viram. Além de milhares de alunos não conseguirem se inscrever no sistema unificado de distribuição de vagas (SISU), os que conseguiam tinham seus dados pessoais tornados públicos, um problema recorrente no sistema de “Deformática” da pasta. Estudantes afirmam que era possível alterar as informações, o que o ministério nega. Ocorre que ninguém acredita nem no que o MEC nega nem no que afirma.  Haddad sai de férias depois de amanhã, no último dia das inscrições, que tiveram de ser prorrogada. É a única boa notícia. Sempre que um ministro como ele está sem trabalhar, o serviço rende mais. Continuemos.

A bagunça no INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), autarquia responsável pelo Enem, custou a cabeça de seu presidente, Joaquim Soares Neto. Ficou no cargo apenas um ano. Em 2009, caiu Reynaldo Fernandes, depois que houve vazamento das provas, que tiveram de ser refeitas. Em 2010, além de vazamento, houve erro na confecção dos gabaritos. Para o lugar se Soares Neto, foi nomeada Malvina Tania Tuttman, reitora da Universidade Federal do Estado do Rio (UniRio).

Os leitores deste blog conhecem Malvina Tânia. Eu a homenageei no dia 17 de agosto do ano passado com um post bastante eloqüente já no título: Mais um exemplo da “nova era democrática”: a barbárie intelectual da universidade. Ou: como formar ignorantes orgulhosos e patriotas. No dia 11 daquele mês, Celso Amorim, o Megalonanico, conferia uma aula inaugural. O vídeo, longo, está (aqui). A então reitora fez duas intervenções verdadeiramente estarrecedoras, uma apresentando o ministro; outra saudando a sua palestra. E aproveitou para lembrar que seu mandato iria até 2012 e que ela estava na área. Foi atendida.

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Reproduzo alguns trechos, comentados, da fala da “intelectual” que agora vai cuidar de uma das autarquias mais importantes do órgão máximo da educação brasileira. Leiam com atenção e pensem se desse mato sai coelho ou jumento. É espantoso! E também é a prova de que a sabujice rende benefícios. Eu poderia me abster de comentários como os que seguem se Malvina estivesse sendo nomeada, sei lá, para distribuir sopão. Mas, se é para um órgão ligado à educação, trata-se de um dever profissional. A gramática da “professora doutora magnífica” rivaliza com a de Dilma Rousseff nos transes da ventura sintática e nos dons do pensamento truncado. Numa ousadia realmente digna de nota, Malvina diz que Celso Amorim contribuiu para elevar até a auto-estima dos “nossos irmãos estrangeiros”. Não tentem identificar, em sua fala, sujeito, verbo, complemento, aquelas coisas antigas que caracterizavam os discursos de “magníficos” do passado. Isso passou. Malvina é expressão de uma parcela da universidade brasileira desta “nova era”. Teria dificuldade para trabalhar em telemarketing. A ela:

(…) Celso Amorim, um dos homens deste país que, atualmente, vem imprimindo e mostrando a seriedade desse país não só para fortalecer a auto-estima nossa, do povo brasileiro, mas, em especial, dos nossos irmãos estrangeiros, que, por meio de uma política governamental importante de relações exteriores e, sem dúvida alguma, falava há pouco com o ministro, por conta da capacidade, da força, da história de vida do ministro, do embaixador Celso Amorim, o nosso país, hoje, não só por isso, mas também por isso, tem um reconhecimento e um valor importante internacional. (…) Uma das pessoas que eu considero (…) um dos nomes mais representativos da história deste país
Bem, é o que costumo chamar de “sintaxe na fase da miséria”. A vontade de agradar é tal que a gente nota até uma certa aerofagia, uma emoção verdadeiramente genuína. Imagino a excitação intelectual desta senhora. E vocês já perceberam o vício de linguagem da “companheira”, não? Essa história de “auto-estima” é peça de resistência de todas as campanhas oficiais – e das estatais. Será que Malvina sabe que Celso Amorim perdeu todos os embates em que se meteu, sem uma só exceção?  Eu acho que não. Isso não significa que pudesse dizer coisa diferente se soubesse, mas acho que ela ignora mesmo…
(…)
O ministro, ele não ficará historicamente lembrado, já que estamos numa aula inaugural de história, apenas por sua passagem neste momento político do nosso país, mas enquanto aquilo que ele representa como brasileiro que se orgulha de ser brasileiro e que leva esse orgulho para fora dos muros, das fronteiras do nosso país.
Esse “o ministro, ele” – a anteposição de uma espécie de aposto do sujeito – é um dos vícios de linguagem que mais me irritam e que, vênia máxima, viu, magnífica?, considero índice de ignorância e de pensamento vago. É coisa típica desses pastores televisivos. E o que dizer disto: “O ministro ficará lembrado enquanto aquilo que ele representa…”? Paulo Francis, nessas horas, costumava apelar ao chicote – metafórico, claro…
(…)
E posso lhe [a Amorim] dizer que, além da satisfação de estar reitora neste momento político importante do nosso país, onde as universidades têm recebido um justo olhar para aquilo que ela produz de importante, de ciência para esse país, e isso tem acontecido, nós podemos ter um marco importante, antes de 2003 e depois de 2003, e, por isso, eu posso me orgulhar de estar reitora neste momento, desde 2004, ministro, e completarei o meu mandato até 2012…
***Interrompo aqui, mas o trecho abaixo é seqüência deste, sem corte. Amorim já entendeu, eu acho. O mandato dela vai até 2012… ENTENDEU, AMORIM??? Ninguém pode dizer que ela não está se esforçando para dar vôos maiores. Malvina, como perceberam pediu um cargo e levou. Sigamos:

, mas eu quero também lhe cumprimentar e lhe dizer da grande satisfação de Malvina Tuttman, cidadã brasileira, estar, neste momento, sentada ao lado de um grande homem, um homem que fortalece o nosso país, um país que vem crescendo e que irá, se ainda não surpreendeu, irá surpreender não só alguns brasileiros incrédulos, mas Irá surpreender o mundo.
Ah, apareceram os “brasileiros incrédulos”, aquela gente nefasta que insiste em não acreditar nas verdades eternas do petismo e do governo. A gente nota que Malvina é mesmo entusiasmada. Não lhe basta falar como reitora, não! Ela quer dar seu testemunho pessoal, falar também como “cidadã”, evidenciando que seu engajamento não é apenas profissional. Ela está nessa de corpo e alma mesmo.  Dona Malvina poderia “cumprimentá-LO”, mas “lhe cumprimentar” jamais! A língua é democrática, magnífica! Oferece pronomes oblíquos tanto para verbos transitivos diretos como para os indiretos. Se a senhora servisse cafezinho na Uni-Rio, eu não lhe faria tal cobrança, mas como é a reitora…
(…)

Encerrando

A fala de Malvina é uma colcha de retalhos de bordões oficiais e das muitas mistificações do petismo. Até nos vícios, repete a linguagem “companheira”. Seu discurso é a expressão daquela maçaroca de bobagens entre nacionalistas e patrióticas, que mal escondem o viés militante.

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A universidade é o local da pesquisa e do pensamento, não da justificação do poder. Por mais que os centros de excelência, no mundo democrático, sejam integrados ao establishment, essa integração se dá na esfera dos valores, de uma cultura votada para o progresso, para a diversidade e para a tolerância. Servilismo ao governo de turno é outra coisa. É patente na fala da “magnífica” a satanização do passado, a exemplo do que faz o governo que Celso Amorim representa, com o seu discurso recheado de clamorosas imposturas. Ok, dona Malvina não precisa concordar comigo. Mas há um modo decoroso até mesmo de puxar o saco.

Imaginem: esse “bobajol” está sendo cotidianamente repetido nas salas de aula Brasil afora, especialmente, como é o caso, nos chamados cursos da área de humanas. E depois nos perguntamos por que a escola brasileira é tão ruim. Eis aí: Malvina dá a receita para a formação de ignorantes orgulhosos e patriotas.

*

Texto originalmente publicado às 14h49 de ontem
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