PSDB x PT: sobre verdades, mentiras e equívocos
O Jornal Nacional e o Jornal da Globo, confrontando as imagens do SBT com outras feitas pelo celular de um repórter da Folha, evidenciaram com clareza inquestionável que a agressão que forçou o tucano José Serra a interromper a caminhada no Rio não foi aquela exibida pelo SBT, a da bolinha de papel. Ontem à […]
O Jornal Nacional e o Jornal da Globo, confrontando as imagens do SBT com outras feitas pelo celular de um repórter da Folha, evidenciaram com clareza inquestionável que a agressão que forçou o tucano José Serra a interromper a caminhada no Rio não foi aquela exibida pelo SBT, a da bolinha de papel. Ontem à noite, o presidente do PT, José Eduardo Dutra, como se vê em filme abaixo, reconhecia isso. A verdade não impediu o PT de contar mentira no horário eleitoral. Insistiu na versão da bolinha de papel, acusando o adversário de mentir.
É o lixo! É o fim da linha! É o vale-tudo, levado ao ar, desta feita, com a colaboração de uma emissora de TV. Consta, não vi, que o jornalismo do SBT reconheceu o seu equívoco ou algo assim. O fato é que a farsa já havia ganhado corpo, e a escória moral mobilizada em favor da mentira e da desqualificação já havia sido mobilizada. O que isso significa? Eles não têm limites. No seu programa, o PSDB conta não a sua versão — porque não estamos diante de uma divergência de pontos de vista —, mas a verdade.
O que o PT faz com os episódios do Rio não é diferente do que faz com as privatizações. Mente sobre isso com igual desenvoltura e mau-caratismo. Assim como o partido sabe que não foi apenas uma bolinha de papel que atingiu o tucano, sabe que não existe uma só evidência para afirmar que, se eleito, o adversário pretende privatizar o pré-sal e a Petrobras. E daí? O partido não tem o menor compromisso com os fatos.
Baixaria
Tenho tratado da questão aqui há mais de um mês, desde o primeiro turno: boa parte do jornalismo critica os tucanos por estarem supostamente explorando a questão religiosa — embora este tenha sido um debate iniciado pelas igrejas —, mas não critica os petistas por mentirem sobre as privatizações. Ainda que o PSDB tivesse levado ao ar “as posições” (no plural) de Dilma Rousseff sobre o aborto, por exemplo, não estaria recorrendo a nada mais do que a verdade.
Ocorre que a campanha tucana, até agora, é refém do politicamente correto, dos “censores” bem-pensantes de certa imprensa escrita, que exigem que o PSDB dispute o Troféu Fair Play, e de seus próprio bom-mocismo amanhecido. Do PT não se esperam nem educação nem decoro, tampouco a verdade — afinal, “eles são assim mesmo”. Chega-se, pois, ao absurdo lógico segundo o qual os tucanos não podem recorrer a certos fatos para retratar o PT porque seria coisa de “conservadores e reacionários”; já os petistas podem mentir à vontade.
Pegue-se o exemplo da pauta religiosa, que certo jornalismo esquerdofílico tentou eliminar do debate a golpes de censura moral. Digam-me uma só democracia — umazinha miserável que seja — em que o aborto e questões ligados à vida e à moral não sejam temas de debate e confronto de idéias. Não existe! Ninguém seria capaz de citar. É MENTIRA QUE OS TUCANOS TENHAM LANÇADO ESSA QUESTÃO. Poder-se-ia dizer que até foram surpreendidos por ela. A campanha na TV buscou associar Serra discretamente à disciplina cristã, mas não mais do que isso. Ao contrário: o horário eleitoral fugiu do tema. Na segunda semana do segundo turno, a campanha estava de volta à maximização do minimalismo administrativista…
Pegue-se uma pauta fundamental em qualquer democracia: obediência à lei. Como o PSDB tratou, por exemplo, a questão do MST, que diz respeito a milhões de pessoas e está diretamente ligada à segurança jurídica e garantias previstas até na Declaração Universal dos Direitos Humanos? Simplesmente não tratou. Não seria delicado tratar do direito à propriedade. Ficaria com a fama de “reacionário”…
Verdade e mentira
Volto ao caso das privatizações. A resposta ao terrorismo petista, inclusive no direito de resposta que o PSDB conseguiu no horário da Dilma, é pífia: trata-se da questão de modo temeroso e defensivo. É claro que não dá para debater conceitualmente a questão. O eleitor tem o direito de saber os números da Petrobras de 1995, primeiro ano do governo FHC, e de 2002, último ano; tem o direito de saber a evolução da produção de petróleo nesse período. Veja-se o caso da Vale do Rio Doce: a mais entusiasmada defesa da privatização, até agora, foi feita por um petista, irmão de José Genoino, em nome do PT. O partido disse “não” a uma proposta de plebiscito propondo a reestatização.
Não obstante, a satanização corre solta, sem resposta. O que explica? Só pode ser uma leitura torta, vesga, paralisante, de pesquisas qualitativas que indicam que o eleitor não gosta de privatizações etc. O PT tem os mesmos dados. Assim, enquanto Lula e sua turma usam a percepção média para fazer terrorismo, o PSDB usa essa mesma percepção para correr do tema, como se não tivesse virtudes a exibir. Há também muito de vaidade: “Nossa campanha não vai ceder à pauta da campanha do adversário”. Marqueteiros têm um ego maior do que a própria obra. Não se trata de ceder à pauta, mas de fazer o bom debate.
Invertendo?
Alguém poderia dizer: “Pô, o PT faz aquele programa pilantra, e você bate no PSDB?” Não estou batendo em ninguém. Apenas deixo claro, com exemplos, que um dos lados não encontra fronteira nem na mentira ao fazer a sua pregação e que o outro tem receio de recorrer até mesmo à verdade. A boa máxima de Serra no discurso de lançamento de campanha nem de longe pautou seu programa de televisão: “Quanto mais mentiras disserem sobre nós, mais verdades diremos sobre eles”. Só a primeira parte do período composto aconteceu. A reação proporcional não se deu.
Eu continuo não sabendo quem vai ganhar a eleição. Os que sabiam tudo no primeiro turno quebraram a cara. O que sei é que o PSDB precisa — agora, em 2014, em 2018 — ganhar ou perder contando a verdade. E não apenas a verdade sobre o adversário, mas também a verdade sobre si mesmo.
E isso não é feito. Há pelo menos três eleições a propaganda do PSDB é refém daquilo que o PT acha dele, em vez de ser dono de sua própria história e dizer com clareza o que acha de si mesmo. Ou recupera a narrativa sobre si mesmo ou nada feito.