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Mensalão: Alguns absurdos do novo procurador-geral da República. Ou: Assim não, companheiro Janot! Ou ainda: E Lula? Por que ele não é réu do mensalão?

Rodrigo Janot, novo procurador-geral da República, pode apenas ter se expressado mal. Mais: pode não ter se dado conta das implicações lógicas de uma afirmação que fez e da aberração histórica — e, em certo sentido, processual — de outra. Em suma, o companheiro Janot talvez tenha se atrapalhado um pouco. Mas sempre há o […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 05h21 - Publicado em 22 set 2013, 06h44

Rodrigo Janot: que o procurador-geral se atenha aos fatos, sem ficar olhando para “o lado” e o “outro lado”

Rodrigo Janot, novo procurador-geral da República, pode apenas ter se expressado mal. Mais: pode não ter se dado conta das implicações lógicas de uma afirmação que fez e da aberração histórica — e, em certo sentido, processual — de outra. Em suma, o companheiro Janot talvez tenha se atrapalhado um pouco. Mas sempre há o risco — e, em dias estranhos, cumpre ficar atento — de que, mais do que distraído, ele seja metódico. Aí as coisas se complicam bem.

Janot concedeu uma entrevista a Felipe Recondo e Andreza Matais, do Estadão. A resposta à primeira pergunta que lhe foi dirigida (ou que foi publicada) chega a ser escandalosa. Vamos a elas (em vermelho).
O processo do mensalão está acabando. O senhor vai acelerar o processo do mensalão mineiro?
Pau que dá em Chico dá em Francisco. O que posso dizer é que, aqui na minha mão, todos os processos, de natureza penal ou não, vão ter tratamento isonômico e profissional. Procuradores, membros do Ministério Público e juízes não têm processo da vida deles. Quem tem processo da vida é advogado. Para qualquer juiz e para o Ministério Público todo processo é importante.

Como é que é, doutor?

Péssima resposta! Pau que dá em Chico dá em Francisco? Em que livro de direito doutor Janot aprendeu essa máxima? A que corrente do pensamento jurídico pertence essa maravilha? Há várias questões aí, doutor, e nenhuma delas é boa.

Em primeiro lugar, as condenações do mensalão não constituíram “pau no Chico” coisa nenhuma, mas exercício da lei. Ou Janot discorda?

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Em segundo lugar, o fato de réus de uma ação penal terem sido condenados não implica que os de outra também devam sê-lo, tenha esta o nome que for. NÃO, AO MENOS, COMO PRINCÍPIO. Se forem culpados, que paguem. Ou doutor Janot defende que um processo se deixe contaminar pelo outro? Ou doutor Janot defende que os autos de um sirvam para instruir os do outro?

Em terceiro lugar, espera-se que a Procuradoria-Geral da República não faça o seu trabalho pensando em “dar pau no Francisco” já que seus antecessores deram “pau no Chico”, ou não estará empenhado em fazer justiça, mas em fazer política.

Em quarto lugar, sua afirmação sugere que o trabalho da Procuradoria-Geral da República é, agora, pedir a punição de tucanos, já que os que o antecederam pediram a punição de petistas.

Em quinto lugar, deve-se inferir de seu clichê bem pouco jurídico que, caso não se tivesse dado “pau no Chico”, ele, agora, não se empenharia a “dar pau no Francisco”, uma vez que qualquer ser lógico sabe que a tolice a que recorreu pode ser lida em sentido inverso, mantendo a equivalência, a saber: “Pau que não dá no Chico também não dá no Francisco”.

Em sexto lugar, um procurador-geral da República tem de ser isento não porque trate igualmente todos os partidos, independentemente de suas respectivas culpas, mas porque trata os partidos segundo as suas respectivas culpas. Acho que fui claro, não é, doutor Janot?

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Em sétimo lugar — e agora vem o mais importante: os dois casos não são diferentes apenas por suas respectivas particularidades (volto ao assunto em outra hora). Eles são diferentes, doutor, porque, no mensalão petista, o “pau não bateu em Chico”, mas, no mensalão mineiro, pretende-se “bater no Francisco”. Explico: Eduardo Azeredo, então candidato à reeleição ao governo de Minas quando se deram os eventos batizados de “mensalão mineiro”, é réu no processo. A suposição é que os fatos apontados, que fundamentaram a denúncia da Procuradoria-Geral da República, o tinham como beneficiário último. É? E quem era o beneficiário último do mensalão petista? Não terá sido, por acaso, Lula? E por que ele não se tornou um dos réus?

Mas ainda há tempo. Eu confio na isenção do Gabinete do Doutor Janot. Eu confio na sua divisa de “pau em Chico e no Francisco”. Já que o “Francisco” do PSDB é réu, o novo procurador-geral certamente dará um jeito de fazer o pau acertar o “Chico do PT”.

Aberração histórica
Talvez o substituto de Roberto Gurgel não tenha tido tempo de ler o calhamaço. Quem sabe não tenha prestado atenção aos votos de alguns ministros do Supremo. Por que digo isso? Leiam mais um trecho da entrevista:
O senhor comunga da ideia de que [o mensalão petista] foi o maior escândalo da história do País?
O que é maior? Receber um volume de dinheiro de uma vez só ou fazer uma sangria de dinheiro da saúde, por exemplo. São igualmente graves, mas eu não consigo quantificar isso. Não sei o que é pior. Não sei se este é o maior caso de corrupção, não. Toda corrupção é ruim.
Talvez pelo envolvimento da cúpula de um governo.
E a (corrupção) difusa? Envolve também muita gente. Dinheiro que sai na corrupção falta para o atendimento básico de saúde, educação e segurança pública. Toda corrupção é ruim.

Comento
Hein? O doutor está a fim de debater, sei lá, o sentido profundo das palavras, o ser-mesmo das coisas, ontologia? Qualquer um que tenha acompanhado o julgamento do mensalão sabe que “o maior escândalo” da história republicana” não tem como referência os valores movimentados (R$ 170 milhões) — até porque, nesse particular, o mais provável é que não se tenha arranhado nem a superfície do caixa. Só a falcatrua recentemente descoberta no Ministério do Trabalho é estimada em R$ 400 milhões. O “maior escândalo” sempre quis dizer “o mais grave”. Afinal, não se tratou apenas de desviar dinheiro público em benefício desse ou daquele, mas também de montar uma máquina criminosa para tomar de assalto o estado, para tornar irrelevantes os Poderes da República; para fazer com que o país fosse governado por uma república paralela, das sombras. Os “marginais do poder”, como definiu o antigo Celso de Mello, estavam tentando aplicar um golpe.

Ao dar essa resposta mixuruca, doutor Janot repete, diga-se, o ministro Roberto Barroso, o “novato” do Supremo, e acaba minimizando a gravidade do mensalão. De resto, que jeito é esse de lidar com as palavras? Afirmar que um escândalo é “o maior”, por acaso, exclui a evidência de que “toda corrupção é ruim”?

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A biruta do doutor Janot está desajustada. Espero também dele que não ceda ao “clamor das multidões”, que tanto horroriza Celso de Mello e Roberto Barroso. Mas igualmente espero que ele não ceda ao “cochichos dos corredores”. Costumam ser bem menos legítimos.

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