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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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É PRECISO INVESTIGAR, SIM, SE ASSASSINO DO RIO TINHA VÍNCULO COM TERRORISMO ISLÂMICO

Um delegado havia comentado que cartas deixadas por Wellington Souza, o assassino da escola do Rio, fazia referências ao islamismo. Um dos textos divulgados logo depois da tragédia aludia a alguma seita cristã. Segundo o homicida-suicida, membros de sua família e ele próprio eram testemunhas de Jeová. E não se falou mais em islamismo. Reportagem […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 12h18 - Publicado em 11 abr 2011, 07h35

Um delegado havia comentado que cartas deixadas por Wellington Souza, o assassino da escola do Rio, fazia referências ao islamismo. Um dos textos divulgados logo depois da tragédia aludia a alguma seita cristã. Segundo o homicida-suicida, membros de sua família e ele próprio eram testemunhas de Jeová. E não se falou mais em islamismo. Reportagem exibida no Fantástico de ontem — não tinha visto, mas leitores chamaram a minha atenção —, no entanto, recolocam a questão. O vídeo segue abaixo. Transcrevo o trecho mais importante. Comento depois:

https://video.globo.com/Portal/videos/cda/player/player.swf

Transcrição de um trecho

(…)
Em nota, a liderança das Testemunhas de Jeová no Rio de Janeiro diz que “o homem que cometeu os crimes bárbaros na Escola Municipal Tasso da Silveira não era membro da religião das Testemunhas de Jeová.” E expressa “solidariedade às famílias das vítimas”.

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Nos últimos anos, Wellington parece se interessar também por outra religião: o islamismo. Uma das irmãs do atirador disse à polícia, em depoimento, que Wellington passou a freqüentar uma mesquita no Centro do Rio. Na carta, ele relata um conflito:
“Já errei com minha família, mas eu mudei com o alcorão e eles não confiam em mim…”

Wellington faz referência ao que seria um grupo. E relata dividir o próprio tempo entre orações e reflexões sobre o terrorismo.
“Estou fora do grupo, mas faço todos os dias a minha oração do meio-dia, que é a do reconhecimento a Deus, e as outras cinco, que são da dedicação a Deus e umas quatro horas do dia passo lendo o alcorão. Não o livro, porque ficou com o grupo, mas partes que eu copiei para mim. E o resto do tempo eu fico meditando no lido e algumas vezes meditando no 11 de setembro”.

Para o professor de Teologia, a mudança é um sinal claro da confusão mental de Wellington: “Acharia muito difícil um Testemunha de Jeová realmente trocar Jesus por Maomé. Não é que seja contraditório, que seja um contra o outro, mas acho meio complicado um fanático por Jesus ser fanático por Maomé, acho difícil acontecer”.

O sheik Jihad Hassan diz que Wellington não era muçulmano e afirma categoricamente:
“A religião islâmica proíbe esses atos. A religião islâmica não dá amparo, não ensina, a religião islâmica não dá esses ensinamentos, ela não acolhe esse tipo de pessoa, esse tipo de pensamento, a religião islâmica ensina o bem. Ensina a preservar a vida, e não a tirar a vida”.

Apesar de viver em aparente isolamento, Wellington Menezes de Oliveira deixou muitas pistas que precisam ser seguidas para entender qual foi o caminho que o levou a praticar tal barbaridade. Seguir essas pistas não é um trabalho fácil, porque é preciso separar o que é fato, realidade, do que é pura ficção.

Documentos como os que o Fantástico apresenta levantam muitas perguntas, que precisam ser respondidas. Por exemplo: Wellington participou de algum grupo extremista, com ligações até no exterior, como diz nos papéis? Ou isso é apenas fruto de uma imaginação fértil e doentia?

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No manuscrito, Wellington volta a citar o “grupo” e o nome de alguém que teria vindo do estrangeiro se repete: Abdul.
“Tenho certeza que foi o meu pai quem os mandou aqui no Brasil. Ele reconheceu o Abdul e mandou que ele viesse com os outros precisamente ao Rio, porque quando eu os conheci e revelei “tudo” a eles eu fui “muito” bem recebido e houve uma grande comemoração”

No mesmo trecho, ele diz algo que pode ser uma referência ao atentado de 11 de setembro. O tal Abdul parece ter se vangloriado de quase ter participado do atentado às torres gêmeas, uma fanfarronice para impressionar Wellington, se for verdadeira essa interpretação:
“E o Abdul teve uma conversa comigo e me revelou que conheceu meu pai e que chegou a comprar uma passagem para um dos voos, mas não fazia parte do plano e usou uma identidade com algum dado incorreto pensando no futuro para não reconhecerem ele”.

Mais adiante, surge um novo nome, Phillip. E sinais de desentendimento dentro do grupo.
“Tive uma briga com o Abdul e descobri que o Phillip usava meu PC para ver pornografia. Com respeito ao Phillip, eu já esperava isso. Mas do Abdul eu não esperava isso. Nos dávamos bem e ele sempre foi flexível nas nossas conversas e dessa vez ele foi muito rígido.”

O motivo da briga teria sido uma menina, de uma certa igreja, que Wellington teria tentado levar ao grupo:
“É que eu resolvi falar sobre a menina que me convidou a ir à igreja dela e antes de eu terminar, ele já foi cortar ela logo no início, ao invés de ouvi-la. Depois disso ele me ligou umas vezes e eu disse que estou saindo por respeito ao grupo”

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Wellington também manifesta vontade em conhecer países de população islâmica:
“Pretendo trabalhar pra sair desse estado ou talvez irei direto ao Egito.”

Além da carta, a polícia encontrou uma folha com anotações soltas, e uma referência à Malásia, um país de maioria islâmica, onde há alguns dos edifícios mais altos do mundo. Ele anota que é preciso verificar as condições climáticas da Malásia em setembro, mês dos ataques de 2001 em Nova York. Sinais de uma mente delirante, obcecada por atentados:
“Retornar fotos e dados sobre tais condições climáticas na Malásia no mês de setembro”.

A fixação pelo terrorismo tinha sido percebida por pessoas que conviviam com Wellington, como o barbeiro que o atendia há sete anos. À polícia, ele disse que “no último ano Wellington passou a deixar a barba crescer, atingindo o comprimento até o peito”. Quando brincou com Wellington, dizendo que cortaria a barba dele, o cliente o impediu, dizendo: “Vou ser expulso”.

O barbeiro entendeu que Wellingon se referia ao grupo de islamismo, pois ele dizia que o islã era a religião mais correta, e que estava estudando o alcorão. De tudo o que veio à tona, não há dúvida de que o assassinato dos 12 alunos foi obra solitária de Wellington. Mas os manuscritos revelados pelo Fantástico podem levantar uma ação paralela: o atirador teve contato com algum grupo radical? Abdul e Phillip existem? A polícia vai investigar?

“Eu acho que é uma necessidade. Nenhuma prova pode ser excluída. Há necessidade de se buscar tudo, desde uma simples suspeita. Se a gente pensar num quebra-cabeça, e uma investigação é sempre um quebra-cabeça, uma peça pequena pode estabelecer várias ligações e pode dar a solução para a montagem de um mosaico. Tudo é importante numa investigação. Qualquer policial sabe muito bem disso”, avalia Walter Maierovitch, jurista especializado em criminologia.

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Voltei
Estou entre aqueles que consideram que o assassino suicida fez o que fez porque estava mentalmente perturbado — esquizofrênico, esquizóide, psicopata, sei lá… OS FATOS, NO ENTANTO, E NÃO OS PRECONCEITOS, indicam que seu eventual contato com o extremismo islâmico no Brasil tem, sim, de ser investigado — ainda que, existindo, isso  eventualmente não tenha relação direta com o que aconteceu.

Note-se que essa aproximação não é apontada só pelas cartas. Uma irmã sua diz que ele tinha passado a freqüentar uma mesquita. O barbeiro informa que ele se referia ao islamismo como a religião correta. “Abdul” e “Phillip” existem? Se existirem, as mensagens que Wellington deixou indicam que não são exatamente boas companhias.

Descartar a aproximação ou uma tentativa de conversão por conta das incompatibilidades entre islamismo e cristianismo, como faz o professor de teologia, é bobagem. Conversão religiosa não pede congruência entre o que se era e o que se passa a ser — aliás, o antes e o depois são necessariamente incongruentes.  Quanto ao sheik Jihad Hassan, um pouco mais de rigor não faria mal. Existem o islã pacífico e o violento, não é mesmo? Ou ele nega que os afegãos que massacraram recentemente funcionários da ONU fossem islâmicos? Podem até ser maus islâmicos, mas são.

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O rapaz queimou o seu computador e ainda deixou uma mensagem para a Polícia sugerindo que era inútil tentar encontrar pistas; eles estaria protegendo seus amigos… Tudo delírio?

Terroristas no Brasil
Se não houvesse notícia sobre a atuação de extremistas no Brasil, todos poderíamos ficar mais tranqüilos. Mas a verdade é que há. Reportagem de capa da VEJA da semana passada e outra publicada
nesta semana tratam das raízes que o extremismo islâmico fincou no Brasil. Isso é fato inquestionável; nada tem de delírio.

Se algum grupo pretende montar uma célula extremista no Brasil, mobiliza gente como Wellington? Depende o propósito. Se alguém estivesse em busca de um doidivanas capaz de tudo, não de um de formulador, ele parecia uma pessoa bastante “cooptável”, certo? Não pensem que os homens-bomba são mentalmente muito mais saudáveis do que o maluco daqui. Também eles são movidos pelo ódio a tudo aquilo que admiram.  Sendo verdade que ele manteve esses contatos, nota-se que houve também o distanciamento. Poderia estar sendo preparado para coisa muito diferente, mas as vozes de sua mente perturbada podem ter triunfado sobre as eventuais vozes perturbadas de estranhos interlocutores. Não sei se sua narrativa é falsa. Verossímil, ao menos, e boa parte ao menos, ela é.

O terrorismo já opera em solo brasileiro, como está evidenciado. Se essa gente começar a se aproximar dos Wellingtons da vida, poderemos colher frutos bem desagradáveis. Lembrem-se que uma célula do terror iraniano cometeu dois atentados contra judeus na… Argentina! Um dos mentores do ataque, demonstrou a VEJA na semana passada, entre e sai do Brasil quando lhe dá na veneta.

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