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A queda de Kadafi e o mundo que nos espera

Muamar kadafi já era! Os rebeldes tomaram Trípoli, o bastião de resistência do tirano. Consta que dois de seus filhos foram presos: Mohammed Kadhafi e Saif Al-Islam, que funcionava como uma espécie de porta-voz do regime e parecia empenhado em dar um ar civilizado ao pai. O que será da Líbia? A queda de um […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 11h01 - Publicado em 22 ago 2011, 07h31

Muamar kadafi já era! Os rebeldes tomaram Trípoli, o bastião de resistência do tirano. Consta que dois de seus filhos foram presos: Mohammed Kadhafi e Saif Al-Islam, que funcionava como uma espécie de porta-voz do regime e parecia empenhado em dar um ar civilizado ao pai. O que será da Líbia?

A queda de um déspota asqueroso como Kadafi é, em si, uma boa notícia. Posto o fato no conjunto da obra, aí é preciso aguardar. Os ditos rebeldes não são exatamente paladinos da justiça e da liberdade. E há evidências disso. O regime que se seguirá ao de kadafi será mesmo democrático? A democracia é um “valor universal” para os… democratas! Mais: é preciso que haja democratas para que exista democracia. Não é um bem imaterial, só um norte ético, que os homens de bem buscam alcançar. Trata-se de um modelo de governo, que não se subordina, por exemplo, a uma religião. Quantos querem democracia na Líbia?

Não foram os ditos “rebeldes” que derrubaram Kadafi, mas a Otan — na verdade, Estados Unidos e Inglaterra. A aplicação da tal resolução da ONU, que aprovou apenas a proteção aos civis, foi violada de maneira clara, insofismável. A Otan se meteu numa guerra civil, sem a autorização de ninguém, e escolheu um dos lados. Bombardeou de modo sistemático posições de Kadafi para permitir o avanço de seus adversários.

Os governos da Tunísia e do Egito — e logo acontecerá o mesmo com o Iêmen, quem sabe com a Síria — caíram no enfrentamento com os seus adversários internos, sem uma intervenção estrangeira. Na Líbia, como se viu, foi diferente. Sem os EUA e a Inglaterra — e a Otan —, é bem possível que Kadafi tivesse vencido. Isso impõe às potências ocidentais uma obrigação: zelar pela qualidade democrática do futuro governo. Eu me permito ser um tanto cético.

A Líbia de Kadafi foi, durante muitos anos, um celeiro de terroristas — aliás, era governado por um. Aí o homem se engraçou com o Ocidente, declarou inimigos os jihadistas e passou a colaborar efetivamente com o combate ao terrorismo, tanto que recebeu o afago dos governos dos EUA e da Grã-Bretanha. O jihadismo se alinhou com os rebeldes. Alguns de seus soldados são veteranos ainda da guerra do Afeganistão contra a… União Soviética! Quem dará o tom do novo governo? É uma tolice imaginar que toda a sociedade líbia repudia Kadaf.

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Parece que eu estou pouco animado? A questão, é evidente!, não é essa. Quero mais é que o tirano arda no mármore do inferno. Mas é preciso que fiquemos atentos ao governo que lá vai se instalar e a seus valores. Democracia, já disse, não cai do céu. EUA e Grã-Bretanha se fizeram promotores e guardiões do “novo regime” líbio. Se o Egito, a Tunísia e outros países que enfrentam revoltas nas ruas optarem por formas veladas de ditadura, a Otan não tem mesmo nada com isso. No caso da Líbia, terá de demonstrar que não abriu fogo contra o governo do país para entronizar novos facínoras.

Egito
As coisas são mais complexas do que faz crer, por exemplo, um Barack Obama, grande expoente da simplificação. O atentado a Israel evidenciou um fruto indesejado, mas absolutamente previsível, da desconstituição do governo daquele país. Os terroristas saíram de Faixa de Gaza e chegaram ao Sul do Israel passando por território egípcio. E não foram contidos. Três soldados do Egito morreram na resposta israelense, o que já inflamou os ânimos. Dá-se como certo que, qualquer que seja o governo que se instale no país, ele certamente será mais anti-Israel do que a ditadura de Mubarak. Parte do território iemenita é hoje controlada por forças ligadas à Al Qaeda. A Irmandade Muçulmana mobiliza milhares que hoje pedem a renúncia de Bashar Al Assad na Síria.

Se é um primado moral e ético censurar a ação de déspotas sanguinários como Mubarak, Kadafi e Bashar Al Assad, não dá para fazer de conta que forças democráticas despertaram de seu longo sono para depor governos tiranos, dispostas a morrer — no caso da Líbia, da Síria e do Iêmen, dispostas também a matar. Infelizmente, as coisas não se dão dessa maneira. Alguém as mobiliza e com um propósito. O Egito já emitiu um péssimo sinal. Ainda que se venha a constituir um núcleo de governabilidade pautado pela democracia — as coisas andam confusas por lá —, esse governo certamente não tratará os terroristas a ferro e fogo, como fazia Mubarak; essa era a única face positiva do seu regime, o que valia também para Kadafi, ao menos o dos últimos anos.

Eu gostaria de estar mais otimista, mas não estou, não. Há algo de profundamente errado quando se afirma que a “Primavera Árabe” contribui para aumentar os riscos de Israel. Que diabo de “primavera” é essa que expõe ainda mais ao perigo uma nação democrática e contribui para elevar a tensão no Oriente Médio? Às vezes, sinto um tanto de “inverno da razão” nessa euforia, o que não quer dizer que aqueles tiranos sejam menos moralmente miseráveis do que são. Aplaudo o fim de Mubarak, de Kadafi e, quem sabe, de Bashar Al Assad… E só. Ainda não dá para saudar uma nova aurora.

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