Assine VEJA por R$2,00/semana
Imagem Blog

O Leitor Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Por Maicon Tenfen
Lendo o mundo pelo mundo da leitura. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

Como o swing salvou o capitalismo

O medo da liberdade sexual pode ter ajudado a economia de mercado a se manter no topo

Por Maicon Tenfen 1 set 2017, 04h15

Já pensou como seria legal se todos pudéssemos praticar o “amor livre” sem culpa e sem preconceito do princípio ao fim da nossa vida sexual? Enfim nos libertaríamos da rotina e da monotonia que acompanham as uniões monogâmicas.

— Entediada, querida? Por que não liga para o seu professor de Yoga?

— Ele tá ocupado.

— Hoje tem aula?

— São as novas alunas. A onda do poliamor pegou pra muita gente.

Continua após a publicidade

— Hum. O jeito é ligar para a manutenção da TV a cabo.

E assim, enquanto a esposa se diverte com algo mais animado que um seletor de canais, o marido sai e se encontra com a sua nova conquista, 20 anos mais jovem, que naturalmente se contentará com um sexo casual sem nenhuma dessas cobranças bobinhas que costumam preencher os diálogos post coitum.

Bom demais para ser verdade?

Calma que estamos apenas começando.

Continua após a publicidade

No sábado à noite, o casal se arruma e vai à igreja, ou ao clube de swing, conforme a gíria do nicho, onde sempre encontra pessoas maravilhosas para transar nos mais diferentes arranjos, do ménage mais gemebundo ao voyeurismo mais discreto, do toma-lá-da-cá cheio de regrinhas ao grupal-vale-tudo-selvagem numa dark room com densidade demográfica chinesa.

Depois, em casa, ele e ela comentam a noitada como amigos que discutem os lances mais técnicos do último Fla-Flu. Nada desses ciuminhos normalmente subentendidos nas palavras de esposas neuróticas e maridos inseguros. Apenas se “reencontram”, os dois, no santo leito do amor conjugal.

— Tanta gente na nossa vida — diz ele. — Mas a verdade é que redescubro você a cada orgia. Te quero mais, meu amor, cada vez mais, mais, mais!

— Eu que o diga — responde ela, próxima do décimo oitavo orgasmo da noite. — Eu que o diga!

Continua após a publicidade

Você gostaria de experimentar tamanha democracia conjugal?

Pois é.

Seja como for, sempre vem aquela perguntinha inevitável para azucrinar: se a coisa é tão boa, tão libertária e tão descolada como o modelo acima, por que nunca funcionou em larga escala? Por que ouvimos e lemos tantas histórias de frustração com o meio? Por que os swingers também se divorciam?

Engana-se quem pensa que o “amor livre” é uma criação dos anos 1960. Nasceu muito antes, no mínimo com as utopias que adquiriram formulação teórica ao longo do século XIX. De todas as utopias, aliás, o “amor livre” soa como a mais bela, libertária e transformadora, pois toca diretamente no que temos de mais humano e individual: o corpo e o comportamento.

Continua após a publicidade

Muitos foram os pensadores que criaram comunas experimentais para colocar as coisas em prática. O caso mais famoso no Brasil foi a Colônia Cecília, fundada em 1890, no interior do Paraná, por um anarquista italiano chamado Giovanni Rossi. A colônia enfrentou vários desafios para se erguer, a começar pela organização do trabalho agrícola, mas esse foi um problema insignificante se comparado ao que realmente levou o empreendimento ao colapso: a tentativa de implantar o “amor livre”.

A quem quiser se inteirar do caso em detalhes, recomendo a leitura de Um Amor Anarquista, do escritor paranaense Miguel Sanches Neto. É um romance, mas baseado em rigorosa pesquisa histórica. Mostra que, apesar dos esforços doutrinários de Rossi e do exemplo que dava ao lado da esposa, o ciúme e a desconfiança de homens e mulheres causaram a polarização do grupo e o abandono da comuna.

O sonho virou pesadelo.

Por isso há quem diga que a repressão sexual — ou a tentativa de superá-la — é que salvou a sociedade de mercado. Lideranças acráticas como Rossi tiveram relativo êxito em explicar como organizar a produção de bens e serviços à revelia do capitalismo, mas sempre fracassaram ao insistir na libertação das genitálias, eterno motivo de discórdia e confusão.

Continua após a publicidade

Como as demais utopias, o “amor livre” foi para o beleléu.

Alguém há de lembrar a atual proliferação dos clubes de swing. Pois esta é a prova do fracasso. A partir do momento em que se criam espaços de exceção para o exercício da sexualidade, podemos ter certeza de que o modelo tradicional prevaleceu.

Os clubes do gênero parodiam a utopia de Giovanni Rossi, com a imensa vantagem de que ninguém precisa criar nada. Está tudo pronto, ainda que tudo seja fake e um tanto conformista. Você vai lá, passa a madrugada brincando de sátiro e depois volta para a sua vidinha ordeira e produtiva.

Voltarei ao tema.

 

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.