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Cem anos da grande batalha, uma semana de punhaladas

Britânicos lembram a mais mortífera ofensiva da história e se espantam com a guerra sem trincheiras da política

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 5 dez 2016, 11h21 - Publicado em 1 jul 2016, 10h02
A grande mortandade: I Guerra custou quase 1 milhão de mortos para o Reino Unido

A grande mortandade: I Guerra custou quase 1 milhão de mortos para o Reino Unido

Não vamos falar aqui dos cem anos da Batalha do Somme, o dia de espantosa mortandade na I Guerra Mundial, no quadro do referendo em que os britânicos votaram pela saída da União Europeia.

Mas, como os paralelos são irresistíveis, vamos lembrar que as cerimônias em memória das vítimas do primeiro dia da batalha, o mais mortífero da história do Exército britânico, com 19 240 vidas ceifadas em 24 horas, coincidiram com outra data.

Completa-se hoje a mais extraordinária semana da vida política do país desde a queda de Margaret Thatcher, em 1990. O sangue que correu nesses sete dias foi apenas simbólico, com punhaladas pelas costas e pela frente, com reviravoltas espetaculares. Uma prova das vantagens da política como representação da guerra, em lugar da coisa em si.

A paz mundial não está ameaçada pela decisão de 52% dos eleitores do Reino Unido. A unificação da Europa teve e continua a ter um papel importante na criação de estruturas para evitar morticínios como os dos dois grandes conflitos do século XX, mas o que estabilizou o mundo depois de 1945 foi o poder dos Estados Unidos de evaporar adversários. O regime soviético entendeu isso, buscou os mesmos instrumentos mortíferos e assim se instaurou o “equilíbrio do terror”: um lado poderia varrer o outro do mapa, literalmente, e por causa disso ninguém o fez.

A I Guerra Mundial ocupa um lugar especial na psique coletiva dos britânicos devido à ideia, que historicamente pode ser contestada até o fim dos tempos, de que poderia ter sido evitada – na II, com um regime nazista no poder na Alemanha, não abria outra opção.

A simples comparação entre o número de vítimas mostra o preço da guerra “evitável”. As vítimas britânicas da segunda grande guerra, entre militares e civis, chegaram a quase 450 mil. As da primeira foram mais do que o dobro: quase 995 mil.

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O trágico primeiro de julho de 1916 representa toda a absurda perda de vidas que ceifou a juventude britânica. Também representa o inferno da guerra de trincheiras, as veias abertas no solo do norte francês feito para produzir civilização e barbárie: champanhe e mortandade recíproca de homens conduzidos por regras de cavalheirismo que, nos primeiros natais do conflito, faziam trégua, cumprimentavam-se e cantavam juntos hinos celebrando o nascimento de Cristo.

A batalha travada na região do rio Somme foi uma ofensiva planejada pelo alto comando britânico para virar a situação no teatro de operações: os franceses estavam prestes a ceder ao avanço alemão. Durante sete dias, as linhas alemãs foram bombardeadas. No oitavo, começou o avanço por terra. Em situação tática superior, os alemães não só não recuaram como dizimaram os tommies, o nome popular dos soldados comuns.

A batalha continuou por mais 140 dias. Ao fim deles, havia 1,5 milhão de baixas, entre mortos e feridos, dos dois lados. Diante de números dessas proporções, é preciso respeito e cautela sobre paralelos históricos.

O atual estado desarranjado da política britânica é uma consequência do jogo rápido da democracia parlamentarista e das eternas ambições humanas, não o vestíbulo de tragédias indizíveis.

O lance mais surpreendente, numa semana em que a sucessão de notícias-bomba  parecia a que se viu no Brasil recente, foi a decisão de Boris Johnson de desistir de ser candidato a líder do Partido Conservador e, portanto, primeiro-ministro.

Só o fato de ser chamado pelo primeiro nome já mostra como Boris tem apelo popular. Segundo amigos, seu estilo histriônico é uma espécie de persona que ele usa para tornar palatável ao grande público uma inteligência insuportavelmente brilhante.

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Foi Boris quem “ganhou” o plebiscito, atraindo o apoio necessário para o voto pela saída da União Europeia, numa dobradinha com o menos popular  Michael Gove. Eurocético de raiz, Gove tinha uma imagem de integridade, reforçada pela origem popular: foi adotado quando bebê, na Escócia, por um casal sem grandes recursos. Não estudou na dobradinha de elite, Eton e Oxford, como Boris e o primeiro-ministro a caminho do fim, David Cameron.

Numa rasteira histórica, Gove anunciou que também vai disputar a liderança dos tories, depois de concluir que, apesar de seus “atributos admiráveis”, Boris não tem as qualidades necessárias para comandar o partido e o país nesse momento. Diante de uma plateia de parlamentares que apoiavam sua candidatura, Boris disse que estava desistindo.

Houve até choro. Fato relativamente raro na política britânica, lágrimas rolaram também em outro palco. Uma parlamentar de origem judia saiu soluçando da reunião em que o Partido Trabalhista estava lançando um estudo do  anti-semitismo em suas próprias fileiras.

A deputada foi hostilizada e o próprio líder trabalhista, Jeremy Corbyn, que resiste a uma enorme rebelião interna contra ele, fez uma comparação infame, colocando o Estado de Israel no mesmo plano que organizações jihadistas muçulmanas como o Estado Islâmico. É, realmente, de chorar.

A falta de compostura, num país em que a dignidade pública é cultuada, tem deixado outras vítimas. Inconformada com o resultado do referendo, a revista Economist propôs até um jeitinho para que ele seja driblado. Que feio, parece que está sofrendo de demofobia.

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