Assine VEJA por R$2,00/semana
Imagem Blog

Letra de Médico Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Orientações médicas e textos de saúde assinados por profissionais de primeira linha do Brasil
Continua após publicidade

O cérebro é ideológico? O que a medicina diz sobre isso

Atitudes políticas são associadas a causas ambientais. Mas a neurociência tem demonstrado que fatores neurobiológicos podem mediar essa orientação

Por José Alexandre Crippa
Atualizado em 25 Maio 2017, 17h54 - Publicado em 25 Maio 2017, 12h00

Por ocasião da Revolução Francesa (1789), os membros da Assembleia Nacional eram divididos entre os leais ao Rei ‒ sentados à sua direita ‒ e aqueles apoiadores da Revolução ‒ sentados a sua esquerda. Ao longo dos anos, esta divisão foi substituída pelo espectro “conservador” (direita) e “liberal/progressista” (esquerda).

Em termos gerais, os indivíduos, partidos e nações de “esquerda” tendem a preconizar o ideal igualitário em detrimento a questões morais, religiosas, culturais e nacionalistas, bem como o maior controle do Estado na economia. Por outro lado, a “direita” preconiza o livre mercado com a menor participação do Estado em todos os setores e tende a valorizar os direitos individuais, com conservadorismo em termos morais, religiosos e culturais.

Embora as atitudes políticas sejam comumente associadas apenas a causas ambientais, as neurociências têm demonstrado algumas evidências de que fatores neurobiológicos podem mediar a orientação ideológica das pessoas.

Personalidade versus ideologia

Estudos sistematizados relacionaram traços específicos de personalidade com a ideologia política. Neste sentido o conservadorismo foi associado com preferências por estabilidade, tradição e ordem, oposição à mudança, preferência pelas artes mais tradicionais, conformismo com as normas sociais, busca por segurança e autoproteção, e cuidado na exploração de novas situações.

Continua após a publicidade

Por outro lado, os liberais/progressistas tendem a apresentar maior flexibilidade, abertura à ambiguidade e desorganização, busca por novas experiências e sensações, preferência pela arte abstrata e capacidade de minimizar estímulos negativos. Assim, os conservadores apresentam tendência a atribuir os comportamentos negativos a motivações internas dos indivíduos, enquanto as pessoas de esquerda são inclinadas a relacionar a conduta individual a fatores externos.

Observa-se ainda que os conservadores tendem a responder a situações ameaçadoras com mais agressividade e são mais sensíveis às expressões faciais de ameaça. De certo modo, estes traços de personalidade coincidem com as atitudes políticas dos indivíduos dentro do espectro liberal-conservador. Entretanto, os estudos também sugerem que a ideologia não é totalmente dependente da personalidade, como demonstrado por estudos longitudinais, pois mudanças nos traços de personalidade ao longo do tempo não leva necessariamente à modificação na orientação política do indivíduo.

Ideologia pode ser genética?

Aspectos genéticos também parecem influenciar a ideologia individual, conforme observado em alguns estudos populacionais. Uma pesquisa com gêmeos demonstrou que o conservadorismo político tende a ter maior determinação genética, particularmente entre os homens.

Continua após a publicidade

De modo mais consistente, posteriormente se demonstrou que a orientação política em jovens é influenciada por uma variante do gene do receptor de dopamina (DRD4), um neurotransmissor ligado a busca por novidades, motivação e recompensa. Mais recentemente, estudo com estudantes chineses de uma universidade em Singapura, mostrou que aqueles indivíduos com duas cópias do alelo 4 (4R/4R) eram significativamente mais conservadores. Essas potenciais interações entre o genótipo, ambiente e ideologia política levantaram a hipótese de que estes aspectos possam levar a repercussões na estrutura e funcionamento cerebral.

Um estudo pioneiro de imagem cerebral realizado por pesquisadores em parceria com a BBC Radio 4, em Londres, demonstrou que o liberalismo/progressismo político está associado a maior volume do cíngulo anterior. O aumento desta estrutura cerebral tem sido relacionado à tolerância à incerteza e conflitos, o que permitiria estes indivíduos a aceitar perspectivas mais de esquerda. Nesta mesma pesquisa o conservadorismo político foi associado a maior volume na amígdala cerebral direita, uma região cerebral ligada a maior sensibilidade ao medo.

Uma vez que muitas destas estruturas cerebrais, nas quais foram identificadas diferenças entre liberais e conservadores, estão ligadas a avaliação de risco e ao planejamento de decisões, mais recentemente procurou-se avaliar de que modo estas áreas funcionam durante tarefas relacionadas a riscos.

Continua após a publicidade

Assim, foram comparados eleitores do partido Democratas (que tendem a ter valores liberais/progressistas) com Republicanos (que geralmente preservam valores conservadores). Em consonância com os estudos prévios de estrutura cerebral, os Republicanos demonstraram maior atividade na amígdala direita quando tomando uma decisão de risco, uma região que é importante para avaliação de medo, risco e recompensa.

Por outro lado, os Democratas demonstraram maior atividade na ínsula posterior esquerda, uma região cerebral classicamente associada a emoções viscerais do corpo. De modo interessante, as imagens cerebrais foram capazes de predizer a ideologia política dos voluntários com quase 83% de precisão ao analisar a atividade cerebral e com exatidão de 71% quando o tamanho da estrutura cerebral foi avaliado.

Amplitude do espectro político ideológico 

Todas estas especulações poderiam fornecer uma base para uma neurobiologia envolvida na orientação política individual. Entretanto, é importante destacar que o espectro político ideológico nem sempre pode ser simplificado com a polarização direita-esquerda, que é muito mais ampla do que o investigado nas neurociências até aqui. Como exemplo, sujeitos desinteressados de política; aqueles definidos como de “centro”; ou ainda “anarquistas” e outras variantes não foram incluídos nos estudos.

Continua após a publicidade

Dessa forma, estes achados precisam ser interpretados com muita cautela e não podem ser aceitos cegamente, uma vez que fatores culturais, individuais, familiar e influência dos pares e de diversos outros aspectos são essenciais na determinação da orientação política individual.

Assim, é importante não esquecer o que disse Millôr Fernandes (1923-2012): “A diferença fundamental entre Direita e Esquerda é que a Direita acredita cegamente em tudo que lhe ensinaram, e a Esquerda acredita cegamente em tudo que ensina”.

 

 

Quem faz Letra de Médico

Adilson Costa, dermatologista
Adriana Vilarinho, dermatologista
Ana Claudia Arantes, geriatra
Antonio Carlos do Nascimento, endocrinologista
Antônio Frasson, mastologista
Artur Timerman, infectologista
Arthur Cukiert, neurologista
Ben-Hur Ferraz Neto, cirurgião
Bernardo Garicochea, oncologista
Claudia Cozer Kalil, endocrinologista
Claudio Lottenberg, oftalmologista
Daniel Magnoni, nutrólogo
David Uip, infectologista
Edson Borges, especialista em reprodução assistida
Fernando Maluf, oncologista
Freddy Eliaschewitz, endocrinologista
Jardis Volpi, dermatologista
José Alexandre Crippa, psiquiatra
Ludhmila Hajjar, intensivista
Luiz Rohde,
psiquiatra
Luiz Kowalski, oncologista
Marcus Vinicius Bolivar Malachias, cardiologista
Marianne Pinotti, ginecologista
Mauro Fisberg, pediatra
Miguel Srougi, urologista
Paulo Hoff, oncologista
Paulo Zogaib, medico do esporte
Raul Cutait, cirurgião
Roberto Kalil – cardiologista
Ronaldo Laranjeira, psiquiatra
Salmo Raskin, geneticista
Sergio Podgaec, ginecologista
Sergio Simon, oncologista
Walmir Coutinho, endocrinologista

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.