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A verdade sobre o ‘país do futuro’, segundo Stefan Zweig

Escritor alemão que fugiu para o Brasil durante regime de Hitler ganhou cinebiografia bastante apurada

Por Mabi Barros Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 7 jul 2017, 19h52

‘O Brasil é um país do futuro’, disse Stefan Zweig em uma de suas primeiras viagens ao país. Judeu e alemão, o escritor fugiu de sua terra natal no auge do governo de Adolf Hitler, e encontrou um segundo lar do outro lado do Atlântico. Junto a sua segunda esposa, Charlotte, Zweig viveu no Brasil durante pouco mais de um ano, período que somado às duas viagens anteriores ao país resultaram no aclamado livro Brasil: Um País do Futuro.

O poeta alemão ganhou protagonismo no filme Stefan Zweig — Adeus Europa, disponível para compra e aluguel em sites de streaming como Google Play, Apple TV e Now. Apesar de um bom sumário da vida do autor, a produção peca na omissão de detalhes e ao traçar algumas incoerências com o que foi descrito na biografia Morte no Paraíso — A Tragédia de Stefan Zwieg, de Alberto Dines. Confira:

As filhas de Vargas

(//Divulgação)

Zweig primeiro pisou em terras brasileiras em 21 de agosto de 1936, depois de quinze dias a bordo do RMS Alcântara. O escritor visitava o país a convite do Ministro das Relações Exteriores, José Carlos de Macedo Soares, a quem viria conhecer pessoalmente apenas no domingo seguinte, durante um almoço no Jockey Clube na Gávea, Rio de Janeiro. O quórum da confraternização era composto de “banqueiros, empresários, grandes advogados, acadêmicos, donos de jornais, políticos, diplomatas – la crème de la crème, o que há de melhor em matéria de refinamento”, segundo descreve Dines, representados no filme por uma massa homogênea de atores bem vestidos na mais alta cultura dos anos 1930.

Dois rostos ganham destaque no meio da massa: Alzira e Jandira Vargas, filhas do então presidente Getúlio, apresentadas a Zweig e fotografadas ao lado dele – apesar de simpatizantes das tendências de extrema-direita do pai, que afugentaram Zweig da Alemanha. Por cordialidade ou não, o escritor deu um exemplar autografado de seu livro Amok para Alzira, a filha predileta e oficial de gabinete do pai. Em depoimento a Dines em 1980, ela narrou: “Seu ar melancólico e distante me impressionou. Deu-me um livro autografado, conversamos e posamos para os fotógrafos”.

“Eu não falo sobre política”

(//Divulgação)

Dando continuidade à sua passagem pela América do Sul, Zweig seguiu para Buenos Aires, na Argentina, onde participou do congresso do PEN Club (Associação Internacional de Poetas, Ensaístas e Novelistas). No filme, o escritor alemão participa de uma coletiva de imprensa antes do evento, e é bombardeado de perguntas a respeito de Hitler e a ascensão do nazismo na Alemanha. Ele se nega a responder.

De fato, Stefan Zweig escolheu o silêncio frente aos regimes ditatoriais de direita, pelo menos em um primeiro momento. Quando estava no Brasil, afirmou que não iria se pronunciar contra países com os quais a sua nação anfitriã mantém boa relação — no caso, a sua Alemanha. A mesma razão pode ter motivado o autor a se manter na surdina na Argentina, uma vez que o presidente, o General Agustín Pedro Justo, também partilhava dos ideais do Führer.

No entanto, a coletiva de imprensa ilustrada em Stefan Zweig – Adeus, Europa não aconteceu propriamente. A cena reúne um compilado de perguntas e entrevistas feitas em diversos momentos da passagem de Zweig pela Argentina, e exclui o emblemático momento em que o escritor abaixa a cabeça e chora enquanto Emil Ludwig narrava as atrocidades dos nazistas contra o povo judeu.

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Ajudinha de Eleanor Roosevelt

(//Divulgação)

A fama e o trabalho de Stefan Zweig abriram o caminho por Portugal para ele e Lotte fugirem do cerco de Hitler na Europa, rumo a Nova York, onde fariam uma escala antes de viajar para o Brasil. A ex-esposa do escritor, Friderike, e as duas filhas com seus respectivos maridos não tiveram a mesma sorte. Apesar de fugir de Paris antes que os exércitos do Führer dominassem a capital francesa, hospedando-se na cidade Mountboun, a “ex-família” de Stefan não tinha como sair da Europa rumo aos Estados Unidos, uma vez que o único caminho era pela Península Ibérica, ambas controladas por regimes simpatizantes ao nazifacismo.

Segundo documento disponível no site da Casa Stefan Zweig, museu em homenagem ao autor mantido pelo governo de Petrópolis, a família de Friderike pediu ajuda a um contato de Eleanor Roosevelt, então primeira-dama dos Estados Unidos, instruído a resgatar intelectuais europeus dos avanços de Hitler. Ainda que Zweig tenha sido o responsável por colocar as partes em contato, o personagem do filme fica muito surpreso ao ouvir que a ex-esposa foi ajudada por Eleanor, inclusive lhe é sugerido até que escreva um livro sobre a “novidade”.

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“Brasil, um país do futuro”

(//Divulgação)

O livro Brasil, Um País do Futuro não ganhou a importância devida na cinebiografia. Na produção, o autor é visto desbravando uma plantação de cana no Brasil, e comenta brevemente que quer ir ao Amazonas conhecer a floresta. A icônica frase, que dá título ao livro, é usada pelo filme na primeira visita de Zweig ao país, durante almoço no Jockey Clube do Rio. Porém, não se sabe quando exatamente a ideia foi assimilada pelo autor.

Suicídio em Petrópolis

(//Divulgação)

Stefan e Lotte Zweig foram encontrados sem vida na tarde de 23 de fevereiro de 1942 por Dulce, empregada do bangalô de número 34 da Rua Gonçalves Dias, em Petrópolis. Ao lado dos corpos entrelaçados estavam os copos usados para ingerir o veneno, e diversas cartas endereçadas aos amigos próximos do casal. Segundo Dines, Stefan cuidou para que o suicídio não fosse confundido com acidente.

O filme optou por não reproduzir o suicídio. Apenas o reflexo dos corpos no espelho e o clima de luto na casa são apresentados pela produção. Em seguida, Leopold Stern, falante de francês e alemão, e Cláudio de Souza, alfabetizado em português e fluente em francês, tentam traduzir do alemão a famosa declaração de morte de Zweig. A versão para as telas retrata a tradução como precisa e descomplicada. Porém, a carta publicada na manhã seguinte pelos periódicos apontava para diferentes interpretações. Apesar de Zweig deixar claro no bilhete de despedida a decisão de “deixar a vida por vontade própria, com a mente lúcida” e de “cabeça erguida”, algumas leituras acreditavam que o ato teria sido motivado por uma perda de fé na humanidade e na fraqueza causada por uma longa luta contra as atrocidades do “demônio nazifacista” testemunhadas por ele.

 

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