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A francesa fingida

Tradicional no Rio de Janeiro, a Sopa Leão Velloso não é uma cópia da Bouillabaisse de Marselha, mas aculturação da sua receita clássica

Por J.A. Dias Lopes Atualizado em 30 jul 2020, 20h43 - Publicado em 4 out 2017, 14h50

Por muito tempo se acreditou que a Sopa Leão Velloso, popular no Rio de Janeiro, era um “plágio” da francesa Bouillabaisse – receita famosa de Marselha, na região da Provença, à base de peixes, frutos do mar, tomate, cebola, alho e açafrão. Agora, sabe-se não ter sido bem assim. A Sopa Leão Velloso estreou no Brasil entre as décadas de 1910 e 1920, no cardápio do restaurante carioca Rio Minho, da Rua do Ouvidor, 10, no Centro. Até prova em contrário, quem a introduziu ali foi um cliente ilustre, o diplomata e gastrônomo Pedro Leão Velloso Neto (1887-1947), paulista de Pindamonhangaba.

Consta no “Almanaque do Pessoal do Ministério das Relações Exteriores” (Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, 1946), que ele foi Ministro das Relações Exteriores do Brasil e representou nosso país duas vezes na França, ambas como primeiro secretário, de 1918 a 19 e de 1923 a 26. Depois, veio para o Rio de Janeiro, onde permaneceu dois anos na então sede do Itamaraty, o organismo responsável pelas relações internacionais do Brasil. Nesse período, frequentou assiduamente o Rio Minho, restaurante aberto em 1884. Acredita-se ter sido Pedro Leão Velloso Neto quem entregou a receita ao dono do veterano estabelecimento e pediu-lhe para preparar a Bouillabaisse.

O prato ingressou no cardápio da casa e encantou  a clientela. Além da adaptação aos ingredientes locais, por falta dos existentes na França, mudou de nome. Mas isso não aconteceu apenas para homenagear Pedro Leão Velloso Neto. Cozinheiros, garçons e muitos clientes não conseguiam pronunciar corretamente Bouillabaisse. Portanto, não houve cópia, porém uma aculturação em função da disponibilidade de produtos e, sobretudo, da dificuldade de comunicação.

Sopa Leão Velloso
Pedro Leão Velloso Neto: entregou a receita ao dono do restaurante carioca e pediu para preparar-lhe o prato (Reprodução/Creative Commons)

Por algum tempo, também se divergiu sobre o Leão Velloso que batizou a sopa. No livro “Comidas, Meu Santo!” (Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1964), o dramaturgo e escritor Guilherme Figueiredo sugere que a sopa foi entregue ao Rio Minho por Pedro Leão Velloso, ex-senador do Império e ex-governador da Província do Ceará. A contribuição teria ocorrido ao redor de 1909-10. Entretanto, conforme o historiador Carlos Augusto Ditadi, do Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, esse político morreu em 1902.

Já o jornalista Odylo Costa Filho, no livro “Cozinha do Arco-da-Velha” (Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1997), atribui o feito ao colega de profissão Pedro Leão Velloso Filho, o “Gil Vidal”, do diário carioca “Correio da Manhã”, em inícios do século XX. Entretanto, a história do Rio Minho avaliza que o prato foi trazido da França “por um embaixador” – e o diplomata com sobrenome  Leão Velloso era Pedro Neto.

Segundo a enciclopédia “Larousse Gastronomique” (Librairie Larousse, Paris, 1984), a Bouillabaisse surgiu para aproveitar as sobras das redes dos pescadores de Marselha, cidade e porto da região da Provença, na costa do Mediterrâneo. Eles a preparavam na volta do mar, para suas famílias, com os peixes não vendidos, menos valorizados comercialmente. O nome do prato viria de bouillir (ferver) e abaisser (abaixar), em referência à redução do líquido durante o cozimento. Lagosta e outros crustáceos de preço alto entraram na Bouillabaisse quando ela virou  prato requintado.

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Em Paris, a sopa de Marselha foi apreciada a partir de 1786, quando entrou no cardápio do Les Trois Frères Provençaux. O restaurante praticava a cozinha da região. A Bouillabaisse original leva peixes de rocha. Eis os indispensáveis: rascasse (com barbatanas espinhosas), congro e vermelho. São opcionais o saint-pierre (também de rocha, sem relação com o homônimo brasileiro), a cavaquinha, o tamboril e a lagosta. A receita ainda manda usar cabeça de peixe, cascas de camarão, camarão sem casca, vôngole e mexilhão.

Alguns autores gastronômicos gregos, lembrando que Marselha foi fundada pelos seus ancestrais no século 7º a.C., contam que naquela época se preparava na cidade uma sopa de peixe antiquíssima, de origem helênica, denominada kakavia. O nome vem de kakavi, o tripé utilizado pelos pescadores jônicos. Seria a base da Bouillabaisse. Textos medievais se referem a cozidos de peixe em água ou azeite e vinho, teoricamente ancestrais da sopa francesa.

Os marselheses consomem a Bouillabaisse sorvendo   primeiro  o caldo dos peixes com rouille (ferrugem), um molho de azeite com pão ralado , alho , açafrão e pimenta caiena; depois, saboreiam os variados peixes e crustáceos, mergulhando-os em  um pouco do caldo. Assim a sorvia, obviamente enlevado, o francês Maurice Curnonsky, chamado de  “Príncipe dos Gastrônomos”, que lhe deu o título definitivo: sopa de ouro.  Nada mais justo.

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SOPA LEÃO VELLOSO – RENDE 4 PORÇÕES

INGREDIENTES

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  • 1,5 kg de cabeça de cherne limpa
  • 300 g de polvo novo e limpo
  • 300 g de lulas limpas
  • 200 g de camarões médios limpos
  • 50 g de mexilhões limpos
  • 2 cebolas
  • 1 ramo de aipo
  • 3 ramos de salsinha
  • 3 ramos de cebolinha verde
  • 1 pé de alho-poró
  • 4 ramos de manjericão
  • 1 ramo (pequeno) de alecrim
  • 5 ramos de coentro
  • 2 colheres (sopa) de azeite extravirgem de oliva
  • 2 colheres (sopa) de óleo de milho
  • 6 dentes de alho picados
  • 2 tomates picados
  • 2 folhas de louro
  • 1 cálice de vinho branco seco
  • 1 colher (sobremesa) de colorau
  • 1 colher (sobremesa) de creme de arroz
  • 1 pitada de noz-moscada
  • Sal a gosto
  • Fatias de pão torradas para acompanhar

PREPARO

1. Cozinhe a cabeça do peixe em bastante água, por 30 minutos, com 1 cebola, o aipo, a salsinha, a cebolinha verde, o alho-poró, o manjericão, o alecrim e o coentro. Retire a cabeça inteira, coe o caldo e reserve. Desfie a carne da cabeça e reserve.

2. Cozinhe o polvo e as lulas por 30 minutos. Se for necessário, retire as lulas antes. Tempere com sal e reserve.

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3. Cozinhe os camarões e os mexilhões por 10 minutos. Tempere com sal e separe o caldo do cozimento.

4. Aqueça o azeite extravirgem e o óleo de milho. Coloque a outra cebola bem picada, os dentes de alho, os tomates, o louro e o vinho. Ferva por 15 minutos, coe e reserve esse refogado.

5. Em uma panela de preferência de barro, adicione 1,5 litro do caldo obtido no cozimento da cabeça do peixe e 500 ml do caldo em que foram cozidos os camarões e os mexilhões. Acrescente o refogado e ferva por 15 minutos, mexendo seguidamente. Adicione o colorau, a noz-moscada, ferva por mais 15 minutos e coe.

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6. Engrosse a sopa com o creme de arroz e coloque o polvo, as lulas em pedaços, os camarões, os mexilhões e a carne da cabeça de peixe desfiada. Ajuste o sal,  levante fervura e sirva com as torradas.

Nota: A Sopa Leão Velloso continua a ser preparada pelo Rio Minho, do Rio de Janeiro. Entretanto, outros estabelecimentos da cidade a oferecem. Uma das mais procuradas é a de O Caranguejo, especializado em frutos do mar, na Rua Barata Ribeiro, 771, em Copacabana.

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