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A cajuína cristalina em Teresina

O Brasil inteiro precisa descobrir a deliciosa bebida feita com suco de caju, sem álcool,  popularíssima no Nordeste, musicada por Caetano Veloso

Por J.A. Dias Lopes Atualizado em 30 jul 2020, 20h53 - Publicado em 19 Maio 2017, 15h27

Pode-se dizer que Caetano Veloso fala algumas inconveniências nas entrevistas e declarações públicas, que nem sempre é simpático às pessoas. Mas ninguém nega que ele é um grande compositor e um dos maiores poetas da língua portuguesa. Só um exemplo: a letra de “Cajuína”, a canção que Caetano fez em homenagem a Torquato Neto, poeta piauiense, jornalista e letrista de música popular. O amigo e parceiro de Tropicália – o movimento que sacudiu a música popular e a cultura brasileiras entre 1967 e 1968 – ceifou a própria vida em 1972, um dia depois de completar 28 anos de idade.

 

Tempos depois, Caetano visitou o pai de Torquato em Teresina. Sozinho na sala da casa por minutos, tendo uma rosa menina na mão e na frente de uma garrafa gelada de cajuína, presenteadas pelo anfitrião, veio-lhe, a inspiração. “Existirmos: a que será que se destina?”, indagou Caetano na letra de conteúdo metafísico. E, logo adiante: “Tampouco turva-se a lágrima nordestina/Apenas a matéria vida era tão fina/E éramos olharmo-nos intacta retina/A cajuína cristalina em Teresina”.

Movido pela tristeza, o autor de “Cajuína”  deu o upgrade a uma bebida feita a partir do suco de caju, sem álcool, clarificada e esterilizada, popularíssima no Nordeste, com autoria disputada pelo Piauí e Ceará. Quem tem  razão? Os piauienses, evocando relatos históricos, sustentam que a cajuína surgiu no seu estado e talvez tenha origem indígena. Tanto que adotaram a bebida cajuína como “símbolo cultural da cidade de Teresina” e a proclamaram Patrimônio Cultural do Estado do Piauí.

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Lenildo Lima, da CAJUESPI: a importância do caju e da cajuína na agricultura familiar do Piauí
Lenildo Lima, da CAJUESPI: a importância do caju e da cajuína na agricultura familiar do Piauí (João Albert/Divulgação)

Os cearenses, amparados no depoimento de uma conterrânea ilustre, a escritora, jornalista e cronista política Rachel de Queiroz (1910-2003), atribuem a invenção da cajuína ao baiano Rodolfo Marcos Teófilo (1853-1932), farmacêutico, poeta e escritor regionalista que viveu em Fortaleza. Ele teria criado a bebida para combater o alcoolismo, como um substituto salutar da cachaça.

Pela receita piauiense, produz-se a cajuína lavando o caju e tirando sua castanha; prensa-se a fruta para tirar o suco; descarta-se a polpa; acrescenta-se gelatina, como agente precipitador, para separar o tanino; filtra-se em rede ou funil de pano branco e se engarrafa; coloca-se as garrafas em banho-maria, deixando-as ali entre uma hora e hora e meia, até que os açúcares se tornem caramelizados.

Assim se faz no Piauí uma bebida natural e predominantemente artesanal, aromática, de sabor doce, com açúcar da própria fruta, de cor amarelo-âmbar, sem adição de conservantes, rica em vitamina C e ferro. Na fórmula cearense, cozinha-se a cajuína antes de ser engarrafada. A diferença de técnica e o uso de outras variedades da fruta estabelecem mudanças de cor, aroma, sabor, doçura, leveza e densidade.

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“Em nosso estado, a cultura do caju e a produção da cajuína representam as maiores fontes de renda da agricultura familiar”, diz Lenildo Lima, presidente da Cooperativa de Produtores de Cajuína do Piauí, a CAJUESPI, com sede em Teresina. A instituição reune 2.700 famílias que produzirão este ano 1 milhão de garrafas da bebida. Mas, apesar do resultado expressivo, serão grãos de areia em um negócio maior. Há três mil produtores de cajuína no Piauí, que em 2007 lançarão no mercado 10 milhões de garrafas.

O caju é uma planta nativa do Nordeste, conforme José E. Mendes Ferrão, no livro “A Aventura das Plantas Portuguesas” (Chaves Ferreira-Publicações, Lisboa, 2005). Outros autores sustentam ter origem mais ampla. Seria natural das Caraíbas, sul do México, América Central e América do Sul. Mas Ferrão crava a tese brasileira por dois motivos. Os espanhóis não se referem ao cajueiro nos seus primeiros escritos após a chegada na América. Além disso, localizam-se no Nordeste a origem de 80% das espécies do gênero Anacardium, ao qual a planta pertence.

Enfim, produzida a cajuína, dá-se ao bagaço várias destinações. Utiliza-se em doces, compotas, cristalizados, rapadura; em bebidas como vinho e cachaça de caju. Sem falar na castanha, apreciado produto de exportação. O que falta à cajuína? Conquistar o Brasil inteiro. Apesar da ajuda musical de Caetano, sua difusão no Centro-Oeste, Sudeste e Sul do país ainda é tímida.

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