Olimpíadas deixam legado de mobilidade para o Rio e questionamento sobre gastos de megaeventos
Principais avanços urbanos foram no transporte público, mas experiência carioca levou COI a rever critérios na escolha das sedes
Quando o Rio de Janeiro iniciou o processo de concorrência para sediar as Olimpíadas, em 2007, o Brasil vivia um momento muito diferente do qual encerrou os jogos, nove anos depois. Ainda com Luis Inácio Lula da Silva na presidência, a candidatura do país naquela época, se contrapondo às de Chicago e Madri, era parte da estratégia de aumentar a influência internacional brasileira, que se apresentava como potência emergente idealmente coroada com um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU.
Agora, na pior recessão dos últimos dezoito anos, o país teve de encontrar alternativas para baixar custos e encontrar meios de financiar as exigências do Comitê Olímpico Internacional (COI). Logo antes dos jogos, o cenário era de desconfiança, embalada por atrasos nas obras, instabilidade política e denúncias de corrupção.
Mas, para a surpresa do COI, da mídia internacional e dos próprios brasileiros, os jogos transcorreram bem e atingiram um de seus principais objetivos: deixar um legado urbano para o Rio de Janeiro, especialmente na mobilidade. Deixaram, ainda, um importante alerta para o COI e a comunidade internacional, de que gastos com um espetáculo desse porte são incompatíveis com a realidade de muitos locais e com os problemas ambientais e econômicos mundiais.
O Rio poderá usufruir, para além das Olimpíadas, das expansões portuárias e rodoviárias e da ampliação em 16 quilômetros do metrô e de 450 quilômetros de ciclovias, além da rede de ônibus rápido BRT. Este último promete conectar 60% dos 6,5 milhões de cariocas. De quebra, os Jogos trouxeram a oportunidade de debater e refletir sobre o funcionamento da cidade, passo inicial para qualquer transformação urbana. Esses ganhos já se mostram muito mais eficientes e concretos do que as melhorias prometidas pela Copa do Mundo de 2014.
Claro que o pacote está longe de resolver os problemas da cidade. Até porque, entre os efeitos colaterais das Olimpíadas, estão uma série de despejos de moradores das favelas, que representam 20% do total, e o aumento dos preços dos imóveis, algo comum às cidades-sedes de mega eventos. Para os cofres públicos, a situação também é delicada. Os custos totais de infraestrutura ultrapassaram 20 bilhões de dólares, esticando os orçamentos até o limite.
No final da história, porém, mostrou-se ser viável realizar uma Olimpíada em um país em recessão e onde a desigualdade social persiste. A constatação foi determinante para que o COI anunciasse, no início deste mês, mudanças nos critérios da escolha das cidades sedes, priorizando reformas em vez de novas obras e a criação de estruturas provisórias. Transportes, hoteis e aeroportos terão de ser adaptados às necessidades das próprias cidades, não mais do COI. A decisão vai ao encontro dos esforços globais por soluções mais sustentáveis em detrimento das espetaculares, diretriz que já vem norteando a produção arquitetônica mundial dos últimos anos. Para os Jogos de Tóquio de 2020, por exemplo, o projeto do estádio olímpico foi substituído por um mais barato. Qualquer que sejam as cidades sedes, as Olimpíadas prometem surtir efeitos positivos por mais tempo do que o período da competição.
LEIA TAMBÉM:
O paradoxo de Tóquio: como a cidade mais populosa do planeta foi eleita a melhor do mundo para morar