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Ricardo Setti: O sórdido esquartejamento moral de William Waack

Não se joga no lixo da história uma biografia inteira de seriedade por meia dúzia de palavras ditas em privado, por deploráveis que sejam

Por Augusto Nunes
Atualizado em 15 jan 2018, 17h40 - Publicado em 17 nov 2017, 14h49

O jornalista Ricardo Setti entra no caso William Waack em defesa do jornalista:

O apedrejamento do jornalista William Waack em praça pública – no caso, as “redes sociais” e considerável parte da mídia brasileira – chama clamorosamente a atenção por pelo menos dois fatos: 1) a facilidade com que se decreta e decide, como se fosse para a eternidade, que alguém é racista por ter proferido palavras desta índole em privado, num momento de irritação; 2) a forma tortuosa e covarde pela qual a TV Globo, na qual William trabalhava há duas décadas, o demitiu.

Quanto ao primeiro fato, é absolutamente necessário diferenciar quem, eventualmente, proferiu palavras racistas de quem é racista.

As palavras que um vídeo de bastidores capturou um ano atrás são racistas? Claro que sim. Mas qualquer pessoa que tenha convivido dois dias com William Waack sabe que ele não é racista, condição que gente de todo tipo, em grande parte escrava do politicamente correto, quer impor como queimadura de ferro em brasa na testa de um jornalista esplêndido e de um homem decente e bom.

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William se aproxima do meio século de exercício da profissão. Trabalhou, na imprensa escrita, em veículos de grande porte, nos quais publicou provavelmente mais de mil matérias assinadas. Por duas décadas, como repórter excepcional e apresentador do Jornal da Globo e do ótimo GloboNews Painel, apareceu milhares de vezes diante de milhões de telespectadores. Fez centenas de palestras pelo Brasil afora – e nunca, jamais, por escrito, na telinha ou em carne e osso, diante de um auditório, exibiu sequer um átomo de racismo.

Conheço William há trinta anos, além do que trabalhamos juntos no Jornal do Brasil e no Estadão. E posso testemunhar que não conheço muita gente que se iguale a ele em profissionalismo e em retidão pessoal.

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Não se joga no lixo da história uma biografia inteira de seriedade, competência e rigor como jornalista e de integridade como homem por meia dúzia de palavras ditas em privado, uma única vez, por deploráveis que sejam – e são.

Como escreveu em seu site Chumbo Gordo o jornalista Carlos Brickmann – que, sendo judeu, sabe muito bem desde a remota infância o que é racismo: “Cá entre nós, quem nunca fez piada de português, de loira burra, de preto, de judeu, de turco, de veado, de sapatão? Apresente-se. E atire a primeira pedra”. Brickmann poderia ter ampliado a lista com piadas sobre deficientes físicos, anões, gordos…

O segundo fato que chama escandalosamente a atenção no caso é a rapidez e a forma da demissão de William Waack pela Globo. Espantoso que qualquer profissional, e ainda mais um jornalista fora de série, seja lançado às feras por ter feito “comentários, ao que tudo indica, de cunho racista”, segundo a explicação da própria Globo no dia 8 passado, quando resolveu afastar William de suas funções.

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“Ao que tudo indica” como, cara-pálida?

Ao condenar o racismo e afastar William, a Globo acusou-o de ser racista – acusação gravíssima. Mas onde raios estão as provas? Se existem, quais são? A direção da emissora por acaso procurou obter algum testemunho sobre o “racismo” de William junto a colegas jornalistas? Junto a diferentes técnicos, iluminadores, infografistas, maquiadores? A cameramen, motoristas? A inimigos de William, que seja?

Indagaram sobre o “racismo” nas redações em que trabalhou? Colheram o depoimento de algum assistente de suas palestras?

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“ Sim, racismo é crime”, escreveu o jornalista J. R. Guzzo. “Mas quando você acusa alguém de um crime, qualquer crime, e não prova a sua acusação, você está praticando um outro crime – a calúnia, descrita no artigo 138 do Código Penal Brasileiro”.

E então? Como fica a coisa? A Globo, que hoje em dia procura a todo custo pretender que sempre ouve “o outro lado”, que lado ouviu?

O saldo final disso tudo é triste e assustador. Sem hesitar, esquartejam moralmente e lincham a reputação e a figura de um homem íntegro e de um jornalista que está entre os melhores de todos os tempos no Brasil. William protagonizou coberturas memoráveis como a rebelião promovida pelo sindicato Solidariedade na Polônia, a insurreição que derrubou provocou o linchamento do ditador Nicolae Ceausescu na Romênia, a onda de agitação que percorreu a Europa Oriental até a queda do Muro de Berlim, e o que foi acontecendo depois nos ex-países comunistas.

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Durante a Guerra Fria, foi por longos anos correspondente do Estadão na Alemanha, onde estudara. Depois da queda do Muro, aceitou o desafio dificílimo de ser correspondente em Moscou, já pelo Jornal do Brasil. Posteriormente, exerceu o mesmo posto em Londres. Foi editor de Internacional de ambos os jornais e editor em VEJA.

Jornalista de coragem pessoal, embrenhou-se tanto em meio à Guerra do Golfo que foi tomado refém pela Guarda Republicana de Saddam Hussein, o ditador do Iraque. Com a mesma coragem, publicou um impecável livro sobre a atuação da Força Expedicionária Brasileira na II Guerra Mundial, tal como vista pelos aliados (americanos) e os inimigos (alemães), para o qual percorreu milhares de documentos inéditos – nos Estados Unidos, no Brasil, na Alemanha — e entrevistou combatentes dos dois lados.

As Duas Faces da Glória teve sua primeira edição num ano de delicado equilíbrio democrático, 1985, quando o país saíra da ditadura militar mas o governo Sarney mantinha como ministro do Exército um general linha duríssima, Leônidas Pires Gonçalves, uma espécie de sombra a ameaçar as liberdades públicas. E o livro sobre a FEB, que ressalta a disposição e a bravura dos soldados brasileiros, mesmo mal equipados e mal formados, expõe porém de maneira crua a incompetência, o despreparo e os erros crassos, gravíssimos, de oficiais do Exército que, quando a obra veio à tona, eram figurões das Forças Armadas e da República.

Se este livro bateu na direita, outra obra sua, Camaradas (1993), bate forte na esquerda. Mergulhando em arquivos inéditos em Moscou após o fim da União Soviética, William produziu uma obra que traz a história desta vez nada romanceada do líder comunista brasileiro Luiz Carlos Prestes e de sua futura mulher Olga Benario, a agente da Comintern (a Internacional Comunista, com sede em Moscou) – abordando inclusive sérios desentendimentos entre os dois – e mostra a influência do Partido Comunista da URSS e de dirigentes do partido em outros países no fracassado levante comunista de 1935 no Brasil.

Alguém entre os apedrejadores de William escreveu um texto sórdido segundo o qual se pretende defender o jornalista “racista” deixando de lado o “racismo” para focar-se na exaltação de suas qualidades profissionais, que até o autor, ilustre desconhecido, reconhece.

Não, não e não! É possível exaltar o grande jornalista e, sim, dizer que não há uma evidência, uma só, uma única, uma mísera, de que William seja racista ou tenha sido ao longo de sua vida.

É precisamente este o caso, é o que se faz aqui. Em tempos de ditadura do politicamente correto e de ódio escorrendo pelas “redes sociais”, contudo, quem se importa com esse pequeno detalhe, não é mesmo?

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