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Ricardo Arcon: Tire as crianças da sala. Do museu

Por que é um disparate permitir que uma criança interaja com um artista nu

Por Augusto Nunes Atualizado em 30 jul 2020, 20h43 - Publicado em 6 out 2017, 15h08

Tantos foram os textões sobre a performance no MAM, que este se faz dispensável. Sugiro ao leitor, portanto, debandar-se destas mal-traçadas linhas e procurar algo que lhe traga conforto de espírito e saciedade intelectual. Que tal pegar sua filha ou sobrinha de quatro anos e levá-la para interagir com um adulto pelado num museu de arte moderna? Hum… Sigamos, então, com a leitura.

Desde a última terça-feira (26), o Museu de Arte Moderna de São Paulo vem sendo alvo de protestos. O motivo: a interação, registrada em vídeo, entre um performer e uma criança com a idade dessa sua filha ou sobrinha, dileto leitor. Acompanhada de perto pela mãe e sob o olhar à curta distância daquele que seria o pai, a garotinha toca o homem, que está deitado, inteiramente despido e com o pênis na horizontal (ufa!).

O artista – cujo nome não importa – coloca o próprio corpo a serviço dos espectadores e da obra “Bicho”, da incensada Lygia Clark (1920-1988). “Bicho” é um objeto manipulável, cheio de articulações. Ali, na sala do MAM, os visitantes podiam manipular cabeça, tronco e membros – não está claro se todos os membros – do performer, de modo a alterar sua configuração. A propósito: e se a criança, ingênua e curiosa como toda e qualquer criança, mexesse no pênis do coreógrafo? Imagino a chuva de naturalidade que fariam cair: afinal, o pênis, assim como o nu, é algo que faz parte da natureza humana – logo não cabe tratá-lo como tabu.

Discutir se a performance é arte beira o irrelevante. Embora valha destacar que arte, grosso modo, é algo inalcançável para um leigo. Para ser mais claro: segundo os libertários de plantão, se você for talentoso o suficiente para se despir, deitar no chão e permitir que as pessoas o apalpem, fique à vontade para escrever “artista” na ficha de check-in do hotel (sem ofensa: estou me referindo exclusivamente a esse “número”; o artista em questão pode ser um Picasso, não sei).

A discussão que interessa é outra: sobre adequação. É razoável que um museu e um pai permitam que uma menina de quatro, cinco anos, às voltas com adultos estranhos e vestidos, interaja com um artista sem roupa? Desnecessário (será?) dizer que uma criança nessa idade não tem discernimento, maturidade, senso crítico e senso estético para capturar as intenções de tal demonstração artística. Não tem propriedades intelectuais e emocionais para separar o episódio vivido sobre o tablado do museu de eventuais situações da vida real cujo pano de fundo sejam a erotização ou a violência sexual.

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A mesma lógica perpassa a cartilha de segurança de quase todos os produtos culturais do país. Não se recomenda a uma criança – independentemente de ela estar sob a supervisão dos responsáveis – assistir a filmes em que os atores falam palavrões; jogar games que sirvam de cenário para tiroteios, mortes e derramamento de sangue; ver peças de teatro nas quais se estimule o consumo de drogas ilícitas e a sodomia. “Mas, querido, aí que está, a performance não era erotizante, não tinha nada demais!” Sim. De fato, não era e não tinha – e também não configurava pedofilia. Um adulto, em pleno funcionamento das suas faculdades mentais, sabe disso. Uma criança pode não ter essa clareza.

É desolador ver o rumo que a polêmica tomou. Li tudo que pude a respeito. Como de praxe, dei preferência aos textos que se chocavam com as minhas opiniões. Quase todos frutos de inequívoca desonestidade intelectual. Neles, afirma-se ou sugere-se que a totalidade dos que protestam deseja o fim da exposição ou mesmo o fechamento do museu; o “apedrejamento” do artista e do curador; que os pais percam a guarda da filha; e/ou que o MBL seja reconhecido como a luz a nos salvar do obscurantismo cultural. Eis um modo nada sutil de tentar desqualificar o interlocutor: atribuir a ele ideias de terceiros – preferencialmente as mais radicais. Ei, cara pálida: do, digamos, lado de cá, também somos muitos pelo MAM e a condenar qualquer tipo de caça às bruxas.

De tudo que li, o que mais me tirou a fé na humanidade, contudo, foi gente dizendo que “quem critica a interação entre a criança e o artista não sabe da existência de praias naturistas”, onde famílias inteiras se refestelam sem que ninguém dê piti. Não terei tempo para explicar a diferença entre uma coisa e outra. Agora preciso cuidar das crianças aqui de casa.

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