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Para acabar com chiliques do ex-gerente do bordel, nada melhor que a leitura do que escreveu quando se fantasiava de vestal

Em 7 de outubro, o companheiro José Genoino viajou no chilique ao topar com um grupo de jornalistas nas imediações da seção eleitoral onde vota. A dois dias da condenação pelo Supremo Tribunal Federal, o presidente do PT do mensalão já decidira que iria dormir na cadeia não por deliberação do STF, mas por culpa […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 07h06 - Publicado em 9 jan 2013, 19h00

Em 7 de outubro, o companheiro José Genoino viajou no chilique ao topar com um grupo de jornalistas nas imediações da seção eleitoral onde vota. A dois dias da condenação pelo Supremo Tribunal Federal, o presidente do PT do mensalão já decidira que iria dormir na cadeia não por deliberação do STF, mas por culpa da mídia golpista. A caminho da gaiola por corrupção ativa e formação de quadrilha, o delinquente juramentado segue recitando que as tramoias e trapaças em que se meteu só existiram nas páginas da imprensa direitista, que obrigou o STF a enxergar larápios meliantes onde só existiu um coral de anjos patrocinado por servidores da pátria.

Na cena protagonizada no dia da eleição, Genoino exigiu aos berros que a Polícia Militar expulsasse do local todos os repórteres. E justificou a reivindicação com um discurso que o transformou em forte candidato a orador da turma do mensalão. “Vocês são urubus que torturam a alma humana”, caprichou na catilinária endereçada aos repórteres. “Não podem ficar aqui. Não falo com urubus. Vocês fazem igual aos torturadores da ditadura. Só que agora não tem pau de arara, tem a caneta”.

Quem confunde pau de arara com caneta (e caneta com computador) parece implorar por passeios no pátio do presídio vestindo uma camisa-de-força vermelha com uma estrelinha no peito. Mas de louco Genoíno não tem nada. Não perdeu o juízo. Perdeu a vergonha, sugere um texto escrito nos tempos em que José Dirceu dizia que “o PT não róba nem dêxa robá” sem se arriscar a ouvir de volta uma gargalhada nacional. Transcritos em negrito, os quatro parágrafos abaixo resumem a ópera composta pelo artigo “A corrupção e morte da cidadania”, publicado no Estadão de 29 de abril de 2000. Leiam sem pressa. Volto em seguida.

A corrupção representa uma violação das relações de convivência civil, social, econômica e política, fundadas na equidade, na justiça, na transparência e na legalidade. A corrupção fere de morte a cidadania. Num país tomado pela corrupção, como o Brasil, o cidadão se sente desmoralizado porque se sabe roubado e impotente. Sabe-se impotente porque não tem a quem recorrer. Descobre que os representantes traem a confiabilidade do seu voto, que as autoridades ou são corruptas ou omissas e indiferentes à corrupção, que os próprios políticos honestos são impotentes e que a estrutura do poder é inerentemente corruptora.

Dessa impotência se firmam as noções de que “nada adianta” e de que no fundo “são todos iguais”. A fixação desses sentimentos representa o fim da cidadania, pois ela se baseia na participação ativa do indivíduo na luta por direitos e na cobrança e fiscalização do poder. Quanto mais agonizante a cidadania, mais ativa se torna a corrupção. O corrupto sente-se à vontade para se justificar e até para solicitar o aval eleitoral para continuar na vida política.

O poder no Brasil protege os corruptos. A estrutura do poder público é corruptora. Em paralelo, a estrutura fiscalizadora favorece a impunidade. Mas se a corrupção, sua proteção e a impunidade se tornaram estruturais, há uma vontade explícita de manter intacta a estrutura corruptora. Essa vontade se manifesta de várias formas. A principal é a falta de iniciativa das autoridades constituídas. Outra ocorre pelo bloqueio das mudanças institucionais e legais que visam a ampliar e aperfeiçoar os instrumentos de combate à corrupção. No Congresso, medidas de combate à corrupção e mudanças moralizadoras da Lei Eleitoral foram sistematicamente derrotadas pela maioria governista, com o apoio de chefes dos poderes superiores.

A sociedade já percebeu que a corrupção estrutural está albergada na falta de vontade de mudar e de punir e na vontade explícita de proteger. A racionalidade do cidadão não consegue compreender o porquê e o como de tantos casos de corrupção não resultarem em nenhuma prisão dos principais envolvidos. E porque a razão não consegue compreender essa medonha impunidade, o cidadão sente-se desmoralizado. A corrupção assume a condição de normalidade da vida política do país. A degradação e a ineficiência do poder público atingiram tão elevado grau que não se pode mais acreditar que, apesar de lentas, as mudanças virão.

O confronto entre o Genoino que chamava o camburão e o que hoje desperta do pesadelo ao som de sirenes é penosamente pedagógico. Ilumina porões, sótãos e catacumbas cuja devassa permitirá ver com perturbadora nitidez o que foi o Brasil da era da mediocridade, do deboche, da cafajestagem no poder. Genoino já deveria estar purgando num catre os incontáveis pecados. Está em liberdade e acaba de ser premiado com um emprego de deputado federal. Horas antes de desferir mais essa bofetada no rosto do país que presta, recaiu num ataque de nervos por achar que um jornalista teimava em persegui-lo com “provocações”.

Até ganhar um número de prisioneiro e um catre, um prontuário estará liberado para brincar de representante do povo. Rodeado por colegas de ofício, vai sentir-se em casa. Os 300 picaretas contabilizados por Lula já devem ter passado de 500. Sem sequer aparecer no serviço, Genoino embolsará os salários e “benefícios” relativos a janeiro e fevereiro. Incluídas todas as safadezas legalizadas pela bandidagem com imunidade parlamentar, ganhará mais de R$ 100 mil por mês até que a sentença transitada em julgado encerre a afronta inverossímil. Talvez consiga em torno de 500 mil. Meio milhão de reais. É disso que Genoino gosta, é isso o que genoino quer: dinheiro.

Repórteres escalados para entrevistar político mortos-vivos deveriam ser dispensados de fazer perguntas.  O que Genoino merece é, sempre que ensaiar algum chilique, ouvir a leitura pelo coro da imprensa, aos berros, do artigo que publicou há quase 13 anos. O Brasil gostaria de saber como reagem messalinas vocacionais a palavrórios costurados nos tempos em que, fantasiadas de vestais, tentavam esconder a vontade de divertir-se no bordel.

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