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Fernando Tibúrcio, advogado de Roger Molina, revela mais detalhes da operação tramada pelo Brasil e pela Bolívia para entregar o senador a seus carrascos

A menos de 10 dias do encerramento do prazo para o governo brasileiro decidir se concederá refúgio ao senador boliviano Roger Pinto Molina, o Estadão revelou detalhes de uma operação secreta articulada em março de 2013 pelo Itamaraty para enviar à Venezuela um perseguido político enclausurado na embaixada em La Paz. De acordo com a […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 04h27 - Publicado em 15 fev 2014, 18h58
O embaixador Eduardo Saboia (à esquerda), ao lado do senador boliviano Roger Pinto Molina

O embaixador Eduardo Saboia (à esquerda), ao lado do senador boliviano Roger Pinto Molina

A menos de 10 dias do encerramento do prazo para o governo brasileiro decidir se concederá refúgio ao senador boliviano Roger Pinto Molina, o Estadão revelou detalhes de uma operação secreta articulada em março de 2013 pelo Itamaraty para enviar à Venezuela um perseguido político enclausurado na embaixada em La Paz. De acordo com a reportagem, a ideia de remeter o senador aos domínios de Hugo Chávez (ou à Nicarágua, previa um plano B) foi concebida em parceria com o governo da Bolívia. Se desse certo, a presidente Dilma Rousseff seria poupada de uma decisão que pudesse contrariar a vontade de Evo Morales.

Molina permaneceu 455 dias num quarto da representação brasileira em La Paz até fugir em um carro diplomático com a ajuda do embaixador Eduardo Saboia. Segundo o secretário nacional de Justiça, Paulo Abraão, o senador poderá ter renovada a permissão para ficar no país até que Dilma decida o que fazer com o hóspede indesejado. É provável que o caso só chegue ao desfecho depois das eleições de outubro.

Confira abaixo o comunicado divulgado pelo advogado Fernando Tibúrcio Peña, advogado de Molina, sobre outra prova contundente de que o Brasil lulopetista adotou a política externa da cafajestagem.

COMUNICADO PÚBLICO

A notícia veiculada no Estadão, e assinada pela experiente repórter Andreza Matais, de que teria sido engendrado pelo Itamaraty um plano secreto para levar o senador Roger Pinto Molina para a Venezuela ou para a Nicarágua deve ser vista com extrema preocupação. Caso essa insensatez se tivesse concretizado, o Brasil teria jogado ou alguém sob a proteção do direito internacional num verdadeiro covil de leões, dado o estreito alinhamento ideológico e político que têm aqueles países com o governo de Evo Morales.

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Mas a coisa vai mais longe. A lamentável operação deve ser vista como o capítulo final de uma história que retrata um Itamaraty agonizante, que só permanece vivo porque obstinados brasileiros não desistiram de lutar pela instituição que um dia honrou os seus pais e o seu País. Uma história que teve o seu clímax (ou seria anticlímax?) numa proposta indecente feita a Roger Molina em março do ano passado. O embaixador Marcel Biato – um desses obstinados, justiça seja feita – foi orientado, não sem constrangimento, a propor ao senador, então asilado na Embaixada do Brasil em La Paz, um rol de condicionantes em troca da “liberdade”. A proposta passava por cinco pontos: 1) o senador deveria renunciar ao asilo que lhe fora concedido pelo governo brasileiro; 2) deveria concordar em ser enviado para um terceiro país; 3) deveria assumir o risco de sair da Embaixada sem um salvo-conduto; 4) deveria no seu destino final se abster de criticar o Governo de Evo Morales, e, finalmente, 5) deveria concordar em se avistar com “enviados” da Justiça boliviana, que seriam autorizados a ingressar nas instalações da nossa Embaixada.

Soube que o diplomata Clemente Baena Soares e outros enviados pelo Itamaraty, sem a participação dos integrantes da missão brasileira em La Paz, teriam mantido conversações com a embaixadora da Venezuela, Cris González, com o fim de que fosse cedido um avião de matrícula venezuelana para tirar o senador da Bolívia, com o beneplácito oficial, mas sigiloso, do governo Evo Morales. A reunião que poderia ter selado o destino de Roger Pinto Molina só não ocorreu em razão da embaixadora González ter se deslocado para Caracas, em razão da morte do presidente Hugo Chávez, justamente no momento em que Baena Soares arribava na capital boliviana.

Essa proposta indecente começou a ser rascunhada, ao que parece, logo após a prisão dos torcedores corintianos em Oruro. Numa reunião em Cochabamba, o chanceler boliviano David Choquehuanca teria proposto ao seu congênere Antonio Patriota que o embaixador Marcel Biato – muito crítico dos desmandos do governo Evo Morales – fosse afastado das tratativas para a libertação dos torcedores, condição com a qual o nosso chanceler assentiu. Ao que parece Choquehuanca foi mais além e teria proposto trocar a liberdade dos corintianos pela de Roger Molina. Essa segunda e estapafúrdia proposta teria sido rechaçada por Patriota. Porém, como resultado dessa reunião o senador Molina teve limitado o seu direito de receber visitas e só não foi impedido de falar ao telefone e acessar a Internet porque funcionários da Embaixada exigiram que uma ordem por escrito fosse enviada desde Brasília.

Se algo mais restou de positivo daquela reunião foi que ali se decidiu pela criação de uma comissão bilateral para cuidar do caso do senador. Essa comissão teria se reunido uma única vez em São Paulo. A segunda reunião, programada para La Paz, jamais teria acontecido. Ao que parece, os diplomatas enviados a La Paz sequer foram recebidos pelas suas contrapartes bolivianas. Ato contínuo, foi proposta pelos nossos vizinhos que a frustrada reunião acontecesse em La Antigua, na Guatemala. Desta vez a conversa ocorreu de pé, no corredor. A próxima cartada no jogo da dupla Evo-Choquehuanca foi conseguir que o Brasil assinasse, durante uma reunião de Cúpula do Mercosul em 12 de julho de 2013, uma declaração em que o País se solidarizava com “os Governos da Bolívia, Equador, Nicarágua e Venezuela, que ofereceram asilo humanitário ao Senhor Edward Snowden”, sem que tal declaração dedicasse uma única linha a Roger Pinto Molina, àquela altura há um ano e um mês espremido num pequeno quarto improvisado.

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Daí para a frente a história é conhecida: Molina foi heroicamente retirado da Embaixada, recebi em minha casa a inesperada visita de um diplomata que naquela ocasião integrava a comissão sindicante encarregada de processar o diplomata Eduardo Saboia e por aí vai.

Mas a lembrança que realmente me veio à mente, tornada vívida pela leitura da notícia de hoje, foi o telefonema que recebi do secretário-geral do Itamaraty, Eduardo dos Santos. Disse-me este, em meados de setembro do ano passado, que o meu cliente seria expulso do País caso fosse à Câmara dos Deputados a convite do deputado oposicionista Otávio Leite. Em resposta, expressei toda a minha indignação e deixei claro que não me curvaria a esse tipo de ameaça. Aproveitei a deixa para enfatizar que seria oportuno o embaixador refletir seriamente sobre os limites do Estado. Mas devo confessar que senti o que talvez seja compaixão em relação a Eduardo dos Santos: se há uma coisa que me marcou naquele telefonema foi a sensação de que o secretário-geral estava com medo. E gente com medo, pensei, é o que não falta no Itamaraty. Ainda que estejam longe de constituir a maioria, vem ganhando espaço burocratas que convenientemente se esquecem de que a Diplomacia é e sempre foi uma carreira de Estado. Ou que não menos convenientemente se deixaram contaminar por uma ideologia que lhes vêm assegurando que o próximo posto não vai ser dentro de uma geladeira ou na calorenta Ouagadougou, no Burkina Faso.

Em pouco mais de vinte anos o crack tomou conta das ruas das nossas cidades, fazendo com que milhares de jovens promissores ficassem tão somente na promessa. Hoje, segundo dados das Nações Unidas, sessenta por cento da cocaína produzida na Bolívia vem parar no Brasil. O aumento do tráfico proveniente da Bolívia foi determinante para que o consumo em nosso País dobrasse nos últimos seis anos. Atualmente, três por cento dos universitários brasileiros e quase dois por cento do total da população consomem cocaína regularmente. Não consigo aceitar que um viés ideológico forjado e sedimentado nos corredores das universidades numa época em que era justo e necessário lutar contra a Ditadura nos levou a um quadro crônico de cegueira coletiva que nos impede de criticar essas tais Novas Democracias do Século XXI (um eufemismo para ditaduras), que gostam mesmo, como faziam os militares nos nossos tempos de chumbo, de perseguir os seus opositores. Em nome dessa mesma ideologia aceitamos calados sucessivas provocações de Evo Morales, que espertamente percebeu que pregar contra o “imperialismo” brasileiro, assim como já o vinha fazendo em relação aos chilenos na questão do acesso ao mar, rende votos. Sob o pretexto de corrigir injustiças históricas, apoiamos incondicionalmente um sistema de produção destinado na teoria a abastecer o consumo tradicional, mas que na prática transforma a maior parte das folhas de coca produzida na Bolívia em uma pasta que acaba sendo trocada por carros roubados no Brasil.

A continuar desse jeito, só me falta acordar e, se o meu cachorro não tiver mais uma vez destruído o jornal, ler a notícia de que pegamos o cavalo para trás – ao menos Evo está convencido de que foi assim – e devolvemos o Acre para a Bolívia.

Fernando Tibúrcio Peña, advogado do senador da Bolívia Roger Pinto Molina

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