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Fernando Gabeira: Certas palavras valem mais do que mil imagens

Publicado no Globo Eram cinco horas da tarde, eu cobria uma demonstração na porta do Palácio do Planalto. As pessoas estavam com muita raiva de Dilma e de Lula. Sentiam-se ignoradas depois de terem ido para as ruas no domingo. Queriam a queda de Dilma e a prisão de Lula. Dilma não só não deu […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 30 jul 2020, 23h12 - Publicado em 22 mar 2016, 12h01

Publicado no Globo

Eram cinco horas da tarde, eu cobria uma demonstração na porta do Palácio do Planalto. As pessoas estavam com muita raiva de Dilma e de Lula. Sentiam-se ignoradas depois de terem ido para as ruas no domingo. Queriam a queda de Dilma e a prisão de Lula. Dilma não só não deu sinais de renúncia, como convidou Lula para ocupar um ministério e fugir da Lava Jato.

Uma hora de trabalho e saí em busca de água e um banheiro no Congresso. Ali, soube da divulgação dos áudios.

Em termos cinematográficos, o áudio contém metade das informações de um filme. Nesse caso, os áudios eram toda a informação necessária para inflamar as ruas. As multidões já estavam iradas e o diálogo Dilma-Lula serviu para catalisar um processo que já estava em andamento. Os romances do passado escreviam assim: a marquesa saiu às seis horas. Agora era possível reescrevê-los: Dilma foi para o espaço às seis horas, no rabo de um foguete barbudo.

Só mais tarde, exausto, examinei o conjunto de gravações. Senti que Lula estava acuado, tentando dominar um processo que escapava ao seu alcance. Os interlocutores, inclusive Jaques Wagner e, principalmente, Nelson Barbosa, respondiam com frases curtas, como se estivessem incomodados, loucos para desligar. Ele sabia que era uma luta difícil. Mas lamentava o medo dos outros: o Congresso e o Supremo estavam acovardados. Sua intenção era deter a Lava Jato e criar uma frente de investigados. Se não fizessem nada, seriam todos presos.

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Renan estava fodido, Cunha, idem. Lula parecia assumir sua verdadeira condição de chefe da imensa quadrilha, para salvá-la dos procuradores que, segundo ele, se achavam representantes divinos. Conversas gravadas sempre trazem embaraços. Na intimidade, somos menos cuidadosos. A série de gravações mostrou não só que Lula queria interferir no processo legal. Mostrou algo que não se suspeitava: a falta de carinho e solidariedade com as pessoas que o ajudaram por décadas.

É o caso de Clara Ant. Ela chegou a ser deputada, mas depois disso dedicou-se, inteiramente, a ajudar Lula. Ao que parece, foi um projeto de vida. Participei de um debate com ela, sobre o conflito no Oriente Médio, diante de uma plateia formada por membros da colônia judaica. Ela defendeu, como pôde, a política externa do governo brasileiro. Pareceu-me uma pessoa tranquila e bastante confortável diante de ideias divergentes. Não tenho procuração para defendê-la e, quem sabe, pense a meu respeito todas as barbaridades que a imprensa petista divulga. No entanto, afirmo que não é assim que se trata uma colaboradora de tantos anos, nem é assim que se trata qualquer mulher que tem sua casa invadida por cinco policiais. Lula disse que ela deve ter achado um presente de Deus tantos homens entrando pela porta. Dilma riu. Dilma, a presidenta, a mulher símbolo de uma conquista feminina, ri de piadas machistas desde que contadas pelo seu chefe.

O ângulo político das gravações, nesta altura, já deve ter sido exaurido, e a tentativa de fugir da Lava Jato já se revelou o desastre que todas as pessoas sensatas previam. O ministro Aragão, que tinha como tarefa desmontar a Lava Jato, foi tratado como alguém que é amigo, mas, no momento de fazer as coisas, sempre dizia “Olha’’. Lembrou-me de Sancho Pança, que dizia constantemente: “Olha, mestre, olha bem o que está dizendo’’.

Lula não pode ser comparado a um Dom Quixote, pois seria uma agressão a esse maravilhoso símbolo da cultura ocidental. Ele, simplesmente, estava desesperado. A máquina do governo petista não respondia com eficácia sua ânsia de proteção. Os políticos corruptos marchavam para o matadouro, inertes, à espera da salvação mágica. Ele viria para reagrupá-los, derrotar a República de Curitiba e, certamente, encontrar um meio de financiar as relações obscenas alimentadas pelo mensalão e pelo assalto à Petrobras.

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Sua meta conservadora é cristalina. E, ainda assim, algumas pessoas, militantes e intelectuais, continuam achando-o o caminho do futuro e classificando de reacionário quem se opõe a um projeto criminoso de poder. As hostes petistas receberiam ordens claras para achincalhar os adversários e intimidar os procuradores e policiais da Lava-Jato.

No princípio da semana, fui alvo de ataques desonestos dos sites pagos pelo governo. Talvez já fosse uma minúscula parte do plano. Não creio que quisessem me intimidar; estavam apenas exercitando os músculos. De todos as crises que vi no Brasil, esta tem uma singularidade: a tristeza de milhares de pessoas que acreditaram no poder transformador da esquerda no governo. Falei com alguns senadores que deixaram o PT. Estavam desolados, depois de tantos anos de trabalho. Pelo menos compreenderam a realidade e podem tentar outro caminho. Os oportunistas e carreiristas continuaram agarrados aos seus empregos.

O drama mesmo é dos que não suportam as dores da realidade e insistem na negação. Seguem o seu líder sem o bom senso de Sancho Pança. Não ousam dizer: “Mestre, olhe bem o que está dizendo’’.

No Brasil, pobre quando rouba vai preso, rico quando rouba ganha um ministério. Luiz Inácio da Silva, em 1988.

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